Até o final do ano os investidores que priorizam ativos sustentáveis terão a opção de adquirir cotas de Fiagros (Fundos de Investimento no Agronegócio) que abrangem investimentos em créditos de carbono do mercado voluntário. A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) tem estudado a criação de uma regulamentação definitiva para tornar isso realidade. A ideia é muito boa, mas é bem complexa e exige cautela para que os fundos não caiam em descrédito no futuro.
O mercado de comercialização de crédito de carbono é relativamente novo e ainda um tanto confuso. Na prática, ele funciona como uma forma de compensação. Uma empresa define metas para redução de emissões de carbono. Se ela não consegue cumprir a meta no período estipulado pode comprar crédito oriundo, por exemplo, de algum projeto de reflorestamento de uma área desmatada da floresta amazônica.
É verdade que, por não atingir a meta, esta companhia continua a poluir mais do que deveria. Porém, o entendimento é que ao ajudar no reflorestamento ela faz uma compensação, pois as árvores plantadas fazem a captação do carbono lançado na atmosfera. Claro que é feito um cálculo para que seja comprado uma quantidade de créditos equivalente ao CO2 lançado na atmosfera. Ou seja, se a empresa lança uma tonelada de carbono, o crédito comprado deve equivaler à quantidade de árvores capazes de absorver a mesma quantidade. Grosso modo, essa é a lógica do processo.
Bom, o que a CVM quer é criar possibilidades de investimentos que apoiem a redução de emissões. Os Fiagros em geral têm o objetivo de apoiar a cadeia produtiva do agronegócio. Mas os ativos escolhidos para a montagem dos fundos não têm obrigatoriamente que atender a conceitos ESG. É importante, claro, que sejam sólidos e muito bem avaliados quanto ao potencial de lucratividade e de retorno aos investidores. E só isso. Então, aqueles investidores que buscam apenas ativos sustentáveis, podem não se interessar muito por Fiagros.
A CVM faz muito bem em trabalhar na criação de normas para esse mercado. Pois, além de mais opções para os investidores, cria-se uma forma de financiar projetos sustentáveis dentro do próprio agro. Os recursos desses Fiagros voltados ao crédito de carbono poderão financiar a conversão de pastagens e de terras degradadas e até mesmo em logística, contribuindo para práticas produtivas muito mais eficientes no que tange à preservação do meio ambiente e mitigação de riscos.
O problema é como fazer isso de forma segura e transparente. De acordo com representantes da CVM, ainda existem muitas dúvidas. Entre elas o próprio conceito de governança. Para os Fiagros voltados a investimentos em títulos de crédito, a regulamentação talvez use a mesma governança adotada nos fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs). Já os Fiagros com investimentos em Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e em propriedades rurais talvez possam seguir a governança dos fundos imobiliários (FIIs). Enfim, são possibilidades que a CVM estuda.
E quem poderia investir nesses Fiagros? Faz sentido disponibilizá-lo ao mercado de varejo ou é melhor restringir ao institucional? Outra questão é com relação à integridade dos créditos. Em outros setores é comum a prática do green washing, que nada mais é do que o marketing de algumas companhias para convencer a sociedade de que ela atua dentro de conceitos ESG, quando na verdade ela mal se preocupa com o tema. Para que não seja ofertados falsos Fiagros de crédito de carbono é preciso definir como controlar tudo isso e se adiciona ou não responsabilidades aos gestores.
A questão dos gestores é muito importante. Devido ao seu potencial de crescimento, o Fiagro tem atraído muitos oportunistas. Gente que mal conhece a cadeia do agronegócio, mas que oferece produtos de qualidade duvidosa aos investidores. A CVM atua para criar as melhores regras possíveis, mas parte do trabalho tem de ser feito pelos investidores, fiscalizando e buscando conhecer minuciosamente quem são os gestores de cada fundo existente. E, claro, escolher aqueles sob responsabilidade dos verdadeiros especialistas. Como eu já disse, a ideia de autorizar Fiagros voltados à investimentos em crédito de carbono é ótima, mas os cuidados na hora de investir em um ativo sustentável deve ser redobrado.