Nos últimos meses, o mercado financeiro brasileiro passou por uma transformação notável. Após recorde histórico do Ibovespa em 2023, abril registrou queda de 7% na Bolsa e dólar atingindo seu maior valor em 13 meses.
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno, considera que a euforia em torno de um corte de juros nos EUA em março foi precipitada. O mercado agora aguarda por um possível afrouxamento monetário em junho, julho ou setembro.
“Os dados de atividade econômica estão vindo mais fortes do que o mercado e os economistas projetavam. A inflação, que esperava-se que desse mais sinais de desaceleração, voltou a acelerar nos últimos dados do CPI e está em um patamar que ainda não dá segurança suficiente para o banco central norte-americano inicie ou sinalize um corte de juros”; Explica Sung.
As taxas dos títulos da renda fixa americana, as Treasuries de 10 anos, retornaram, portanto, a 4,5%, após cederem a 3,8% no final de 2023. Com a concorrência do investimento considerado um dos mais seguros do mundo.
O fluxo global de investidores migrou para os Estados Unidos. Até o início de abril, a saída de capital estrangeiro da B3 já totalizava US$ 22 bilhões, contudo, um dos principais motivos pressionando a má performance do Ibovespa.
No entanto, o cenário macroeconômico no exterior não foi o único pilar das projeções otimistas que desmoronou. Contudo, o tão discutido cenário fiscal brasileiro, que influenciou os mercados em 2023 e era considerado pelo menos sob controle, também sofreu deterioração.
Fiscal
Na segunda-feira (15), o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad alterou a meta fiscal de 2025 de superávit de 0,5% do PIB para déficit zero. Para alguns agentes do mercado, isso, contudo, sinaliza um fim para o novo arcabouço fiscal, já desacreditado por economistas e analistas devido à dependência do aumento de receita sem contrapartida de corte de gastos. A notícia abalou o mercado brasileiro, já afetado pela influência dos juros nos EUA e pelos ataques entre Irã e Israel no final de semana.
É um “choque sobre choque” como define Dalton Gardimam, economista-chefe da Ágora Investimentos. “Sem a questão fiscal, talvez o cenário macro não pesasse tanto, ou vice-versa.”
“Em situações iniciais isoladas, o mercado prontamente encontra o novo equilíbrio. Mas o que está acontecendo é que já estávamos preocupados com uma coisa e chegou outra, são efeitos interligados”, diz Gardimam. “A percepção em relação ao Fed é um fator, mas o abandono do esforço fiscal, unido ao fato de que não existe qualquer tentativa de controle de gastos, também explica a mudança de parametrização”.
Com as mudanças fiscais no radar, o mercado brasileiro adotou uma postura pessimista. Os juros longos aumentaram e as taxas dos títulos do Tesouro Direto atingiram o “IPCA + 6%”, um indicador comumente associado a momentos de crise. O dólar subiu para o seu maior valor desde março de 2023 e, na terça-feira (16), ultrapassou os R$ 5,27.
O IBOV registrou uma queda de 1,41% nos três primeiros pregões da semana, acentuando, assim, a desvalorização anual para 7,46%, fechando em 124.171,15 pontos na quarta-feira (17).
Flávio Conde, head de renda variável da Levante Ideias de Investimento, destaca que a mudança na meta fiscal levanta preocupações sobre a relação dívida/PIB do país, o que levou os juros longos brasileiros a dispararem. O aumento das taxas futuras de juros impacta negativamente o preço dos ativos, mesmo que os fundamentos microeconômicos permaneçam inalterados. Conde ressalta que toda a frustração no mercado de ações resulta dessa instabilidade macroeconômica, levando a uma queda excessiva de muitas ações.