- As taxas de retorno do Tesouro IPCA+ superam 7% ao ano, atraindo investidores, mas também gerando preocupações sobre a sustentabilidade da dívida pública brasileira
- Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde, alerta que o Brasil pode não conseguir honrar suas dívidas no longo prazo, o que comprometeria os rendimentos dos títulos como a NTN-B
- Apesar das preocupações fiscais, Stuhlberger elogia a gestão do Banco Central sob Gabriel Galípolo, destacando as altas de juros já previstas como uma medida positiva para a economia
As taxas de retorno dos títulos do Tesouro IPCA+, conhecidos também como Notas do Tesouro Nacional (NTN-B), estão em alta. Ainda, com rendimentos que superam os 7% ao ano, algo que não se via há vários anos.
Essa atratividade, no entanto, vem acompanhada de um questionamento crucial sobre a saúde fiscal do Brasil. Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde e uma das figuras mais respeitadas no mercado financeiro brasileiro, alertou para o risco de o governo não conseguir honrar suas dívidas caso o cenário atual persista.
Atração X Risco
Os títulos do Tesouro IPCA+ são conhecidos por oferecerem uma rentabilidade que combina a inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) mais um prêmio fixo.
Essa combinação garante ao investidor uma rentabilidade real, ou seja, acima da inflação, ao longo do tempo. No entanto, a taxa de 7,85% ao ano, observada recentemente para a NTN-B com vencimento em 2035, gerou controvérsias no mercado financeiro. Para Stuhlberger, esse cenário pode ser perigoso.
Em sua análise, o gestor afirma que, apesar de parecer uma excelente oportunidade de investimento, a rentabilidade prometida por esses títulos não será sustentável a longo prazo.
“Se você me disser que a NTN-B 2035 está pagando 7,85%, tenho certeza de que, para quem comprar esse título e carregá-lo até o final, o juro não será de 8% real pelos próximos 10 anos, porque o Brasil quebra antes”, declarou.
Para Stuhlberger, a sustentabilidade das dívidas públicas brasileiras é o verdadeiro ponto de atenção para os investidores.
O “Piquenique à beira do vulcão”
A declaração de Stuhlberger em relação aos retornos atrativos do Tesouro IPCA+ vai além de um simples alerta de cautela. Ele comparou a rentabilidade de 8% real a um “piquenique à beira do vulcão”. Contudo, uma metáfora que ilustra o risco crescente de uma crise fiscal no país.
O gestor explicou que o mercado financeiro sempre levará em consideração a capacidade do governo de sustentar a dívida ao precificar o risco dos investimentos. Nesse contexto, taxas de juros tão altas podem ser um reflexo do aumento da percepção de risco. Especialmente em um país com grandes desafios fiscais.
Stuhlberger destacou ainda que, embora o cenário seja preocupante, ele acredita que algo terá que mudar, seja por uma mudança de governo ou por uma alteração na postura do atual governo.
No entanto, o gestor deixou claro que nenhuma das alternativas para reverter a situação fiscal é uma solução fácil.
“Não dá para a gente pagar juro de 8% por 10 anos seguidos”, afirmou.
Para ele, as escolhas difíceis que o país terá que fazer nos próximos anos determinarão a sustentabilidade da economia brasileira.
Dólar, juros e o papel do Banco Central
Apesar da gravidade da situação fiscal, Stuhlberger também abordou outros aspectos do cenário econômico. O gestor não acredita que este seja o momento adequado para a compra de dólares, apesar da instabilidade do país.
Segundo ele, o recesso do Legislativo e do Judiciário pode criar um ambiente de incerteza, mas o debate sobre os problemas econômicos do Brasil deve voltar à pauta assim que as atividades políticas e judiciais forem retomadas.
Por outro lado, Stuhlberger fez elogios à atuação do Banco Central, particularmente à transição para o mandato de Gabriel Galípolo. Ele afirmou que a continuidade das altas de juros de 1 ponto percentual nas próximas reuniões do Copom (Comitê de Política Monetária) foi uma medida acertada.
“Até agora, a transição do Banco Central, com Galípolo e Roberto Campos Neto garantindo as duas altas de 100 pontos-base, foi muito bem-feita”, afirmou.
Em sua opinião, a atuação do Banco Central tem sido melhor do que se esperava diante do novo governo.
O desafio de sustentar a dívida pública
A principal questão levantada por Luis Stuhlberger é sobre a viabilidade da política fiscal do Brasil. O retorno atrativo dos títulos do Tesouro IPCA+ é, sem dúvida, um fator tentador para os investidores, mas o cenário macroeconômico do país impõe sérios riscos a longo prazo.
A alta taxa de juros, somada à crescente percepção de risco sobre a capacidade do governo de honrar suas dívidas, coloca em xeque a segurança de investimentos a longo prazo.
Para muitos, o dilema é claro: até quando o Brasil conseguirá manter a sua política fiscal sem sacrificar a estabilidade econômica? As alternativas podem ser difíceis, e o futuro próximo promete muitas discussões sobre o equilíbrio fiscal e a sustentabilidade da dívida pública.
O mercado, no entanto, continuará a olhar atentamente para esses fatores, precificando o risco de uma maneira cada vez mais cautelosa.