Precipício econômico

Fim do saque-aniversário do FGTS pode arrasar a economia e impactar 343 mil empregos

Dados da consultoria Ecoa mostram que efeito multiplicador da linha de crédito na economia é próximo ao do programa social Bolsa Família.

Fim do saque-aniversário do FGTS pode arrasar a economia e impactar 343 mil empregos

O fim do saque-aniversário do FGTS pode trazer impactos socioeconômicos significativos. Um estudo da Ecoa Consultoria Econômica, encomendado pela ABBC e Zetta, associações que representam instituições financeiras, revela que essa modalidade de crédito já injetou R$ 151 bilhões na economia, gerando impacto total de R$ 273,7 bilhões no PIB, 3,5 milhões de empregos e R$28,7 bilhões em arrecadação de impostos. Somente a título de antecipação, foram R$ 91 bilhões injetados desde 2020.

A cada 1 real direcionado ao consumo pelo saque-aniversário, o aumento do PIB é de 1,8, um efeito multiplicador na economia próximo ao do programa social Bolsa Família, de 1,78. Apenas em 2023, os recursos do produto geraram um impacto de R$ 26,6 bilhões no produto interno e contribuíram para a manutenção de 343mil postos de trabalho. 

A consultoria utilizou a Matriz Insumo-Produto (MIP) para calcular os impactos do saque-aniversário do FGTS. Essa ferramenta representa a estrutura produtiva da economia e permite entender como setores são afetados por mudanças na demanda. 

“A análise de impactos do saque-aniversário é fundamental no atual cenário econômico, em que ainda há dificuldade de acesso ao crédito por uma parcela significativa da população. Encerrar essa modalidade prejudicaria a saúde financeira dos trabalhadores”, afirma Eduardo Lopes, presidente da Zetta.

“Para os trabalhadores, especialmente os negativados, é uma ferramenta eficaz de apoio financeiro, com as menores taxas do mercado”, conclui.

Considerado uma alternativa ao saque-aniversário, o consignado privado tem menor abrangência na população. Enquanto cerca de 130 milhões de trabalhadores podem optar pelo saque, apenas cerca de 46 milhões estão habilitados a solicitar o consignado privado, de acordo com a Caixa e o Ministério do Trabalho. Além disso, a taxa de juros máxima do saque-aniversário é de 1,79% ao mês, mais baixa do que a taxa média do consignado privado, que é de 2,73%.

“É necessário reformular o consignado privado, e apoiamos a iniciativa, desde que sejam consideradas as especificidades do produto e riscos da operação”, destaca Alex Sander Gonçalves,  diretor de Crédito Consignado da ABBC. “Mas se trata de uma modalidade de crédito complementar e de objetivo distinto do saque aniversário. As famílias costumam utilizar o saque-aniversário para as necessidades básicas, como a compra de alimentos e as despesas médicas. Extinguir a antecipação resultará em um aumento significativo dos juros, especialmente  para os negativados”.

Hoje os negativados representam 75% das pessoas que aderem a essa modalidade de crédito.

Sustentabilidade do FGTS preservada

O relatório da Ecoa também analisa os impactos da antecipação para a sustentabilidade do FGTS, utilizado como captação de recursos para o financiamento imobiliário. Desde a implementação do saque-aniversário, em 2020, até 2023, a média de crescimento dos depósitos vinculados ao fundo foi de 8,1% ao ano. Para 2024, já é previsto que esse ritmo de crescimento se mantenha, com saldo vinculado chegando a R$ 615 bilhões. Além disso, a proporção do valor total de saques em relação ao saldo do fundo apresenta tendência de queda. 

“O perfil dos trabalhadores que optaram pela antecipação é majoritariamente de pessoas negativadas, que já enfrentam grandes restrições ao crédito habitacional. Extinguir o saque-aniversário não amplia o acesso à casa própria, uma vez que a principal barreira – a negativação – permaneceria. Além disso, os dados apresentados deixam claro que a sustentabilidade do FGTS não é afetada pela antecipação”, destaca Lopes.

Uso do saque-aniversário

De acordo com pesquisa do Datafolha realizada em maio deste ano, 73% dos trabalhadores que optaram pelo saque-aniversário utilizam os valores  para o pagamento de dívidas e contas atrasadas, evidenciando o seu papel como instrumento de gerenciamento financeiro para as famílias. Além de sua relevância no alívio do endividamento, parte dos recursos também é direcionada para gastos essenciais, como despesas médicas (62%) e alimentação (63%). Os dados são ainda mais expressivos entre as classes D/E, em que 81% dos optantes utilizam os recursos para quitar dívidas em atraso, 74% para despesas médicas e 71% para alimentação.

A pesquisa também aponta que, entre os optantes pelo saque-aniversário, 61% já tomaram o empréstimo para sua antecipação; desses, 64% indicam que o valor disponibilizado via crédito foi suficiente para alcançar seus principais objetivos. Além disso, para nove em cada dez pessoas foi importante ter antecipado seu acesso ao saque-aniversário via linha de crédito.

Uma das pautas em debate para aprimorar o modelo do saque-aniversário é a possibilidade de liberar o saque para quem for demitido sem justa causa. A mudança visa reforçar a rede de proteção dos trabalhadores em situações de vulnerabilidade, mantendo os benefícios da política. Segundo o relatório da Ecoa, a proposta teria um impacto financeiro baixo, de R$ 5,2 bilhões (menos de 4% do total de saques em 2023).

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