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Para se sair bem numa, seja dono da sua própria narrativa

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“Essa carta seria mais curta se eu tivesse mais tempo para escrevê-la”

Mark Twain

Um dos temas que sempre me fascinou na minha profissão é ouvir as narrativas dos candidatos a cargos diretivos ou de gestão ou, melhor dizendo, sua capacidade de storytelling. De maneira geral, quase sempre nos deparamos com quatro tipos de narrativas: 

  1. Aquela longuíssima, em que o candidato aborda desde a infância, dando muitos detalhes desnecessários e claramente preocupado em que não percamos nenhum capítulo da sua história de vida e carreira.
  2.  Aquela bem vaga ou generalista, em que ele pincela alguns pontos da carreira — nem sempre os mais relevantes — mas não se dá ao trabalho de aprofundar alguns deles para que se possa entender o que realmente aconteceu.
  3. Aquela chata, com uma compilação de dados e fatos, sem nenhum tipo de amarração dos temas e do porquê faz sentido que se saiba sobre tudo aquilo.
  4. Aquela superarticulada, em que as passagens mais relevantes são relatadas com uma certa quantidade de detalhes que inevitavelmente lhe faz querer ouvir mais, pois, como em uma boa série de TV, queremos saber o que de fato aconteceu com o protagonista da história.

Como candidato, você claramente gostaria de sempre cair na última, pois é a que lhe fará ser lembrado no momento certo daquela oportunidade que está lhe esperando. Mas como garantir que isso aconteça?

Recentemente, assisti a uma palestra de uma colega de Insead chamada Jessica Mastors, em que ela sugere que você controle a sua narrativa, sendo o dono de sua própria história. Para ela, vale focar em não se perder em detalhes, não repetir na entrevista a informação que já está no seu CV e perguntar à sua audiência como transformar aquela informação em significado. A ideia não é fazer um monólogo, evitando que seu interlocutor saia do ar durante o bate-papo, mas sim gerar interação, para que ele seja capaz de cocriar a narrativa contigo.

Em qualquer entrevista de emprego, o objetivo é, primordialmente, mostrar o porquê você se qualifica para aquela posição, transmitir confiança no sentido de que saberá desempenhar bem o papel, impressionar o interlocutor com suas realizações e lhe dar a opção de se aprofundar nos temas que mais lhe interessarem.

Ela acentua também que uma pesquisa global realizada em 2020 apontou que 84% das empresas citam fit cultural como o fator decisivo no processo de contratação. Dessa forma, o ideal é ver o seu entrevistador como um embaixador cultural daquele cargo, e seu papel é lhe fornecer uma boa experiência, enquanto ele lhe dá um tour sobre aquela cultura organizacional.

Por fim, ela destaca três mudanças de mindset que são cruciais para se conseguir o que busca numa entrevista:

  1. Não se preocupe em dar a resposta certa como o caminho mais rápido para se mostrar como um futuro empregado desejável, mas sim em mostrar autoconsciência, transparência e convicção no seu discurso.
  2. Foque em quem você é e não em quem eles querem que seja, pois tipicamente a conversa não é sobre como você fez, mas sim sobre quem é e porque você fez ou faz daquele jeito, ou seja, é sobre sua identidade.
  3. Não se prenda ao que aconteceu, mas no que pode ou irá acontecer, buscando explicar o que eles podem esperar sobre você naquele desafio.

Na conversa, você deve mostrar quem é como individuo, membro de um time, gestor de pessoas, estrategista e líder. Vale pensar nas seguintes perguntas a serem preparados ao entrevistador:

  • Quais as perspectivas que você traz para qualquer desafio colocado à sua frente?
  • Qual é o ponto de vista único que você desenvolveu sobre determinado problema?
  • Quais as estratégias que tem usado de forma bem-sucedida até hoje?
  • Que habilidades você tem desenvolvido ao longo do tempo e que são relevantes para esse papel?
  • Para onde você enxerga que aquela indústria está caminhando?
  • Quais são os desafios e oportunidades para o futuro?

Muitas vezes, os candidatos pensam mais neles e no que fizeram até ali (monólogo), sem antecipar como se encaixam e o que aquele desafio específico pode ou não estar alinhado com suas habilidades (diálogo).

Por isso, foque nas verdades a respeito das quais possa falar com convicção, ilustre com histórias reais e exemplos concretos, e pinte um quadro diverso, revelando o que o motiva e lhe traz energia. Lembre-se de que o ritmo da narrativa é chave e que aprofundar sempre é possível. Se puder, deixe-os saber quando você está fugindo do script (CV), fale sobre os temas que sempre aparecem em sua carreira, e concentre-se em três e apenas três mensagens que quer deixar gravadas.

Por último, mas não menos importante: tenha o cuidado de devolver o comando da conversa ao entrevistador de tempos em tempos. Afinal, um diálogo é sempre mais produtivo e divertido do que um monólogo.

Por Luis Giolo é co-Líder da Pratica de Conselhos e Sucessão de CEOs da Egon Zehnder no Brasil