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IPO no Novo Mercado: quais são os dois lados da moeda?

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Com praticamente dois anos perdidos por muitas empresas em função da pandemia, não podemos dizer o mesmo quando olhamos pelo lado do mercado de capitais.

Em 2020, 26 empresas abriram capital e, entre ofertas primárias e secundárias, houve uma movimentação que alcançou a casa dos 117 bilhões de reais, ultrapassando o maior número de IPOs (Oferta Pública Inicial, em português) desde 2007.

Já 2021 fechou com um volume de 45 ofertas iniciais de ações, movimentando 65 bilhões de reais.

Olhando esse impulsionamento, é preciso chamar a atenção para uma análise sobre o que a maioria dessas empresas têm em comum.

Seus prospectos são recheados dos assuntos do momento: governança corporativa, Compliance, ESG (Ambiental, Social e Governança, em português), LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais) e demais assuntos correlatos.

E isso tem um motivo: a maioria dessas empresas abriu capital associada ao Novo Mercado, cujo segmento se refere à listagem da B3 da Bovespa para a negociação de ações de emissão de empresas que se comprometem voluntariamente a adotar práticas de governança corporativa além das exigidas por lei.

E por que a preocupação dessas companhias pela desejada governança corporativa? De acordo com a evolução relativa do IBOV — índice formado pelas ações com maior volume negociado nos últimos meses — versus o IGC (Índice de Ações com Governança Corporativa Diferenciada), o desempenho das empresas com governança corporativa diferenciada é significativamente acima das empresas do Índice Bovespa. Ou seja, o mercado paga — e muito bem — pela governança corporativa.

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Também é verdade que a abertura de capital inunda o caixa das companhias para investimento ou ampliação de suas operações e aquisições de novas empresas, mas, também, seus acionistas, especialmente com maior participação, saem por vezes milionários ou bilionários — uma recompensa justa e merecedora por anos e anos de muito trabalho.

Porém, é preciso mencionar sobre a preocupação que surge após a abertura de capital ou venda de parte (ou mesmo o controle) da empresa para investidores: as companhias realmente aplicam o que se comprometem em seus prospectos e formulários de referência acerca de governança corporativa? Em teoria, sim.

Na prática, cabe a indagação ou, minimamente, uma checagem mais aprofundada. Não é incomum, por exemplo, identificar empresas que registram estruturas que não refletem necessariamente a realidade, ou seja, declaram ter excelência em governança corporativa, mas não possuem nem ao menos áreas de Compliance, auditoria interna ou controles internos em níveis apropriados, alinhadas às mais básicas práticas de governança, como a independência e a objetividade.

Mas, deve-se pontuar que as mudanças para essas empresas são muitas e temos que considerar que, por vezes, as regulações poderiam ajudar mais.

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Na regulação da B3, por exemplo, uma empresa do Novo Mercado pode optar por não ter uma área de auditoria interna própria e terceirizar essa atividade com um auditor independente registrado CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

Ocorre que esse tipo de profissional possui funções de auditoria externa e contábil e, neste sentido, possuem metodologia e objetivos bastante distintos da auditoria interna como ela deve ser, sugerindo que, possivelmente, tal determinação não estaria totalmente alinhada às diretrizes, requisitos técnicos e, até mesmo, à missão da atividade.

É importante ressaltar que os profissionais que atuam em auditoria interna, não concordam com a regulação da B3 como ela está redigida.

Se a compreensão da regulação é confusa para profissionais experientes na área, é difícil esperar que os executivos focados na operação das companhias, por vezes, empresas originalmente familiares, consigam discernir adequadamente como se adequar para esse Novo Mundo.

Mas, se há espaço para tantas empresas abrirem capital, espera-se que as regulações facilitem a vida dos executivos, assim como deve haver, necessariamente, capacidade de orientação e fiscalização com base em regras claras. Caso contrário, algum pilar importante dessa estrutura terá boas chances de não estar adequado às boas práticas.

Talvez fosse o caso de a CVM aprimorar seus registros internos, incluindo um cadastro específico para prestadores de serviços de auditoria interna focado em um arcabouço de requisitos técnicos e de rotinas de avaliação e fiscalização de empresas cadastradas — de maneira que elas sejam efetivamente capazes de prestar tal serviço.

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E quanto às companhias que possuírem departamento próprio de auditoria interna? Não cabe nenhuma regulamentação? Aqui, até mesmo por questões de isonomia, talvez a B3 pudesse requerer que os profissionais que atuam nas auditorias internas próprias obtenham a mesma qualificação técnica ou certificação dos “auditores internos externos”, haja vista tratar-se exatamente do mesmo tipo de serviço.

O que vale no final do dia é uma governança, de fato, medida, avaliada e certificada com base nas melhores práticas, pois, isso sim, gera valor para o acionista. E aí, vamos abrir capital?

*Bruno Massard é diretor-executivo de Investigações e Auditoria Interna da ICTS Protiviti, empresa especializada em soluções para gestão de riscos, compliance, ESG, auditoria interna, investigação, proteção e privacidade de dados, e Dennis Telles é especialista em Auditoria.


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