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O segundo semestre de 2023 será um período decisivo para a equipe econômica, que enfrenta um desafio imenso para equilibrar as contas públicas e conter o avanço dos rombos orçamentários. Estima-se que o governo precisará buscar mais de R$ 100 bilhões nos próximos meses para alcançar a meta de zerar o déficit em 2024. Esses números foram divulgados pelo Estadão e são uma estimativa do economista Jeferson Bittencourt, da Asa Investments e ex-secretário do Tesouro Nacional.
O governo, que já previa aumentar os tributos em R$ 90 bilhões, agora enfrenta a necessidade de buscar recursos extras para enfrentar a crise nas contas públicas. No entanto, a tarefa de angariar apoio para o aumento de carga tributária tem se mostrado difícil, já que os parlamentares têm resistido a patrocinar medidas impopulares.
O novo arcabouço fiscal, que ainda depende de aprovação no Congresso, impõe ao governo a obrigação de atingir resultado primário zero já no próximo ano e, gradativamente, alcançar um superávit de 1% do PIB até 2026. Um “sonho”, já que a realidade vivida pelo governo é muito diferente da prevista.
Entre as medidas implementadas até o momento, estão a reoneração dos combustíveis e alterações na legislação tributária, que podem acarretar aumento de impostos para as empresas. Além disso, decisões do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal também contribuíram para aumentar a carga tributária, afetando diretamente as empresas e consumidores.
Para fechar as contas, o governo tem estudado uma série de novos projetos arrecadatórios que serão enviados ao Congresso em conjunto com o Orçamento do próximo ano. Dentre eles, a taxação dos fundos exclusivos e dos Juros sobre Capital Próprio, que devem impactar diretamente os investidores e as empresas.
Outra medida que pode gerar receita é o projeto de lei que retoma o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, permitindo o desempate a favor do Fisco em julgamentos tributários. A expectativa é que essas ações, somadas à regulamentação das apostas esportivas e ao combate à sonegação no comércio eletrônico internacional, possam trazer recursos adicionais aos cofres públicos.
Entretanto, é importante ressaltar que essas medidas são impopulares e enfrentam resistência tanto na sociedade quanto no Congresso. A necessidade de arrecadação bilionária é fruto das despesas crescentes que o governo assumiu desde a transição e agora busca compensar. Vale ainda destacar que todas as medidas são para aumento dos tributos e são uma “possibilidade”, já os aumentos das despesas são uma realidade.
Despesas previdenciárias e assistenciais apresentam um aumento significativo, estimado em R$ 80,7 bilhões em 2024, resultado, em parte, da nova política de correção do salário-mínimo, além do impacto da inflação e do aumento do número de beneficiários. Outros R$ 18 bilhões estão previstos para despesas com pessoal, principalmente em decorrência dos reajustes concedidos ao funcionalismo público federal.
No entanto, é notório que a conta nunca irá fechar sem o aumento dos impostos, o aumento do endividamento e a impressão de mais dinheiro, o que pode gerar um ciclo vicioso de inflação, que é combatida com a elevação das taxas de juros.
Diante desse cenário, é urgente que o governo retome a capacidade de gerar superávit e estabilize a trajetória do endividamento, que já ultrapassou a média dos países em desenvolvimento. Hoje, nossa relação dívida/PIB está 73,6%, subiu em relação ao último levantamento e o FMI já faz projeções de que essa relação vai avançar nos próximos cinco anos, atingindo 96,2% em 2028.
Enquanto o governo não enfrentar seriamente essas questões, os rombos nas contas públicas continuarão a ser um empecilho para o desenvolvimento econômico e social do país, comprometendo o futuro das próximas gerações.
O problema dessas medidas (aumento na tributação, impressão de dinheiro e aumento no endividamento público) é que elas são “doenças” que causam inflação, como o descontrole das contas públicas. Neste contexto, a elevação das taxas de juros pode ser utilizada como instrumento de política monetária para conter o avanço inflacionário, usado como remédio na doença causada pelo governo. No entanto, essas medidas podem ter efeitos colaterais, como o aumento do custo do crédito e a desaceleração da atividade econômica. O culpado será o Banco Central?
É crucial que o governo adote uma abordagem mais prudente e responsável na gestão das finanças públicas. É preciso promover um ajuste fiscal consistente, cortando gastos supérfluos, combatendo a corrupção e promovendo uma administração eficiente dos recursos.
Até quando o governo vai se omitir sobre a necessidade fiscal de redução nos gastos públicos e da reforma administrativa? Tal ação é essencial para a busca de um equilíbrio nas contas do governo. O crescente déficit e a crise nas finanças públicas demandam medidas urgentes para controlar o aumento das despesas. A reforma administrativa se torna imperativa para modernizar a máquina pública, tornando-a mais eficiente, enxuta e adaptada às necessidades do país. Ao promover a revisão de cargos, salários e benefícios, bem como a simplificação de estruturas burocráticas, é possível reduzir o desperdício de recursos e a burocracia, tornando a gestão pública mais ágil e eficaz. A combinação dessas medidas visa garantir a sustentabilidade fiscal do país, estimular o crescimento econômico e promover uma administração pública mais responsável e transparente.
Murillo Torelli, Professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).
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