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Pessimismo global: a piora nas perspectivas econômicas

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As engrenagens da economia mundial estão ameaçadas por uma onda de antiglobalismo, alimentado pela guerra na Ucrânia e diversas consequências da pandemia que tardam a esmorecer. O estrago se traduz em números que revelam retrocessos no horizonte. De acordo com cálculos da Bloomberg Economics, o PIB global deverá encolher US$ 1,6 trilhão este ano.

Nas últimas três décadas, o mundo se desenvolveu ao se integrar, com o comércio tendo papel vital nesse aprofundamento das relações entre os países. Porém, os acontecimentos recentes desencadearam rupturas nas cadeias internacionais de suprimentos, pondo em xeque este modelo de abundância, com mais produtos, mais baratos, e mais consumo.

A longo prazo, a Bloomberg estima que uma reversão profunda na globalização tornaria o mundo até 15% mais pobre, com as economias menos produtivas e o comércio global retornando ao patamar do fim dos anos 1990. Nesse cenário, a inflação que vem preocupando vários países, seria ainda mais persistente, alta e volátil.

Mesmo antes da pandemia, já se vinha observando a imposição de barreiras comerciais e alta de tarifas entre as duas maiores economias do mundo, os Estados Unidos e a China. A taxação dos produtos entre os dois países saltou de uma média de 3% para 15% durante o governo Trump.

A esses entraves se somaram as rupturas causadas pela pandemia de Covid-19 e, mais recentemente, as sanções à Rússia — o que tem provocado uma onda de medidas de controle das exportações em outros países. Em 1983, apenas 0,3% do PIB global estava sujeito a sofrer algum tipo de embargo ou sanção. Segundo o levantamento, esse percentual quintuplicou em 2019 e só tende a aumentar após o conflito no Leste Europeu.

O comércio entre regimes democráticos e autoritários equivale a 7% do PIB mundial, e uma divisão entre esses dois pólos poderia elevar as tarifas de comércio em 25%, em média, levando a uma retração de 20% nas exportações e importações. Com isso, mais países internalizariam a produção de determinados itens, encarecendo-os, o que contribuiria para a alta inflacionária.

Para conter a subida de preços, as autoridades monetárias intensificariam os apertos que já começaram a ocorrer, como nos EUA, onde o Federal Reserve (Fed) elevou a taxa de juros em 0,75 ponto percentual para conter a inflação recorde de 8,6%. Trata-se do maior aumento desde 1994, chegando a 1,5%-1,75%. Diante disso, o mercado já prevê que a economia americana atravesse um período de recessão nos próximos trimestres, ainda que curto, já que a medida esfria o consumo e restringe os investimentos de empresas ao encarecer o crédito.

Nos países desenvolvidos, a situação é semelhante. O Banco da Inglaterra (BoE) elevou a taxa de juros para 1,25%, maior patamar desde 2009, enquanto o Banco Central Europeu (BCE) deve começar a elevar o seu indicador em julho. O continente ainda sofre uma crise energética provocada pela Rússia, que está cortando a oferta de energia a clientes europeus, o que afeta a produção de indústrias e o consumo das famílias.

Já na China, a desaceleração é causada pelas políticas rigorosas de contenção do coronavírus, que vêm fechando as cidades e interrompendo a linha de produção das indústrias — esse item, aliás, também tende a ser afetado pela queda de demanda na Europa e nos Estados Unidos. Ou seja, os principais parceiros comerciais do Brasil deverão comprar menos de nós, sobretudo commodities, cujos preços também perigam cair.

Essa conjuntura se forma em um momento bastante delicado para o Brasil, que sofre com a inflação em alta e o freio econômico decorrente da Selic na casa dos dois dígitos. As previsões do Banco Central apontam uma recuperação bastante lenta, com o crescimento do PIB de apenas 1,2% este ano e de 0,76% em 2023.

No melhor cenário, a China conseguirá reabrir a sua economia após controlar o contágio, a guerra na Ucrânia chegará ao fim e as nações trabalharão de forma mais conjunta para evitar a catástrofe isolacionista em que quase todos perdem.

Por Rodrigo Sodré, economista e sócio da BRA