
- FNAC virou fonte de crédito subsidiado a aéreas fora do orçamento
- Modelo reduz transparência fiscal e pressiona dívida pública
- Especialistas alertam para riscos de precedentes e perda de credibilidade
O uso do Fundo Nacional da Aviação Civil (FNAC) como fonte de crédito subsidiado para companhias aéreas acendeu o alerta entre economistas. A estratégia permite injetar bilhões no setor sem que os valores apareçam formalmente no orçamento, criando um subsídio implícito que escapa às regras do arcabouço fiscal.
Apesar de juridicamente respaldado, o mecanismo levanta dúvidas sobre a transparência das contas públicas. Especialistas alertam que, ao abrir mão de receitas maiores, o Tesouro amplia o endividamento e reduz a credibilidade da política fiscal.
Como funciona o modelo
O FNAC é abastecido principalmente pelas taxas de embarque pagas por passageiros e, originalmente, destinava-se a financiar infraestrutura aeroportuária. Com mudanças recentes, os recursos passaram a irrigar linhas de crédito para companhias aéreas, por meio de bancos públicos como o BNDES.
Na prática, o Tesouro transfere o dinheiro ao banco, que empresta às empresas a juros próximos de 8% ao ano. Isso significa menos retorno do que os 13% a 15% que o Tesouro ganharia se aplicasse os valores na Conta Única.
Segundo o ex-secretário do Tesouro, Jeferson Bittencourt, esse diferencial é um subsídio oculto. “O custo existe, mas não aparece como despesa primária. Ele se reflete na dívida pública”, destacou.
Impactos fiscais e riscos
O efeito imediato é a redução da transparência fiscal, já que as operações não entram como gasto primário. O mecanismo dificulta a avaliação da real situação das contas do país, enfraquecendo a credibilidade junto ao mercado.
Além disso, o governo abre mão de receitas, aumentando a dependência de endividamento. Isso pode comprometer a meta fiscal, mesmo que o impacto não apareça nas estatísticas oficiais.
Outro risco é a criação de precedentes: se outros fundos seguirem o mesmo caminho, abre-se espaço para multiplicar subsídios ocultos, corroendo ainda mais a disciplina fiscal.
Justificativas do governo
O argumento oficial é que o setor aéreo vive pressões financeiras com combustível caro, alta de custos e necessidade de investimentos em rotas regionais. O crédito subsidiado seria uma forma de garantir a sobrevivência das companhias e a expansão da malha aérea.
No entanto, especialistas afirmam que o apoio deveria ser registrado de forma explícita. “Não se trata de negar socorro, mas de mostrar claramente o custo fiscal”, defendeu Bittencourt.
A falta de transparência, nesse contexto, cria incerteza e reduz a confiança no esforço de responsabilidade fiscal.
Solução emergencial ou problema futuro?
No curto prazo, a medida ajuda empresas a atravessar um período crítico. Contudo, a dependência de subsídios pode reduzir os incentivos para eficiência e competitividade, perpetuando distorções no setor.
Economistas destacam ainda riscos de governança: sem regras claras sobre quem acessa os recursos e em quais condições, o modelo pode gerar questionamentos jurídicos e abrir espaço para uso político.
Assim, o FNAC se torna símbolo de um dilema brasileiro: equilibrar apoio a setores estratégicos sem comprometer a responsabilidade fiscal e a confiança dos investidores.