
Em meio a um cenário de expansão fiscal acelerada, o Brasil caminha para um risco inédito: a dívida pública pode atingir níveis que tornem seu pagamento inviável nos próximos anos. Sob o terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), os gastos públicos têm crescido em ritmo alarmante, impulsionados por programas sociais turbinados por proximidade com ano eleitoral, reajustes salariais no funcionalismo e despesas obrigatórias que escapam ao controle do arcabouço fiscal.
Analistas e instituições internacionais alertam que, sem reformas urgentes, o país pode enfrentar uma crise de solvência, com juros elevados e inflação pressionando ainda mais as contas.
De acordo com projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), o peso da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) deve saltar de 87,3% em 2024 para 92% em 2025, um aumento de mais de 12 pontos percentuais ao longo do governo Lula – o pior quadro desde a pandemia de 2020.
O Tesouro Nacional, por sua vez, estima que a dívida bruta chegue a R$ 10 trilhões ainda em 2025, podendo crescer quase nove pontos percentuais até o fim do mandato em 2026, alcançando 82,5% do PIB.
Gastos em alta: o motor da crise
O cerne do problema reside na disparada dos gastos públicos. Sob Lula 3, as despesas saltaram de 18% do PIB no fim de 2022 para 18,8% em 2024, mantendo-se nesse patamar em 2025. Embora o governo defenda que o aumento seja impulsionado principalmente pelos juros da dívida – que consumirão R$ 1 trilhão em 2025 –, especialistas apontam para uma série de despesas “por fora” do arcabouço fiscal, executadas via fundos e bancos públicos, que acabam incorporadas à dívida.
A Necessidade de Financiamento do Setor Público (NFSP), que reflete o déficit real incluindo juros, subiu de 4,5% do PIB em 2022 para 5,7% em 2024 e 8,2% até setembro de 2025. “O arcabouço fiscal de Lula perde relevância diante do forte aumento da dívida pública“, afirma o economista Bráulio Borges, da Fundação Getúlio Vargas, destacando que exceções bilionárias para novos gastos retiram credibilidade da regra. Marcus Pestana, da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, vai além: “Muitos técnicos deixaram de considerar o arcabouço em suas avaliações, pois ele falha em disciplinar o gasto e ancorar expectativas para queda dos juros.”
Exemplos concretos incluem o reajuste do salário mínimo acima da inflação, que pode adicionar R$ 165 bilhões à dívida até 2026, e o Bolsa Família ampliado, cujos custos cumulativos pressionam o orçamento. O governo congelou R$ 24 bilhões em despesas discricionárias para 2025, mas isso é visto como paliativo, insuficiente para conter o rombo projetado em R$ 73,5 bilhões.
| Indicador Fiscal | 2022 (Fim de Bolsonaro) | 2024 | 2025 (Projeção) | Variação sob Lula |
|---|---|---|---|---|
| Despesas (% PIB) | 18% | 18,8% | 18,8% | +0,8 p.p. |
| NFSP (% PIB) | 4,5% | 5,7% | 8,2% | +3,7 p.p. |
| Dívida Bruta (% PIB) | 73,7% | 87,3% | 92% | +18,3 p.p. |
| Déficit Primário (% PIB) | -0,4% | -0,5% | -0,7% | Piora de 0,3 p.p. |
Fonte: FMI, Tesouro Nacional e IFI. p.p. = pontos percentuais.
Riscos de insustentabilidade: um ciclo vicioso
A trajetória da dívida cria um ciclo perigoso. Com a Selic em 15% ao ano – o maior nível em duas décadas –, o custo do serviço da dívida consome recursos que poderiam ir para investimentos ou abatimento do endividamento. Cada ponto percentual de alta na Selic adiciona R$ 50 bilhões à dívida em 12 meses. O Banco Central elevou a taxa em 450 pontos-base desde setembro de 2024 para combater a inflação acima de 4%, alimentada pelos gastos excessivos.
“O Brasil já tem a maior dívida entre emergentes; um pouco mais e ela se torna impagável“, alerta Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do BC e presidente da Mauá Capital.
O FMI projeta que o país só volte a superávit primário em 2027, mas céticos como o economista Marcos Mendes veem risco de “déficits gêmeos” (fiscal e nominal) aproximando o Brasil da crise de 2015, sob Dilma Rousseff. Internacionalmente, o endividamento brasileiro (92% do PIB em 2025) supera a média de emergentes (73,8%), elevando o prêmio de risco e pressionando o real.
Especialistas da Reuters e Foreign Policy destacam que compromissos como saúde, educação e previdência crescem acima da inflação, tornando o arcabouço insustentável a médio prazo. Sem cortes estruturais, o governo pode recorrer a medidas heterodoxas, como emissão de moeda, reacendendo temores de hiperinflação.
Esta matéria é baseada em análises de fontes como Folha de S.Paulo, Estadão, O Globo, Reuters e FMI.