
- Milei anuncia aumento de gastos em 2026 após derrota eleitoral e queda de apoio.
- Equilíbrio fiscal foi alcançado, mas custo social elevado pressiona o governo.
- Mercados reagem com dólar em alta, ações em queda e risco país disparando.
A motosserra, símbolo de Javier Milei em sua campanha presidencial por representar a promessa de cortar drasticamente os gastos públicos e reduzir o tamanho do Estado argentino parece estar com os dias contados. Após quase dois anos de austeridade radical, o presidente argentino anunciou uma guinada no rumo de sua política econômica. Milei disse que “o pior já passou” e que, a partir de 2026, aumentará os gastos em áreas sensíveis como saúde, educação e aposentadorias.
A decisão vem logo depois de uma derrota eleitoral na Província de Buenos Aires e a pouco mais de 40 dias das eleições legislativas nacionais, em um movimento que analistas classificam como tentativa de conter o desgaste político e recuperar apoio popular.
Do ajuste ao recuo
O governo Milei vinha se sustentando na narrativa do “maior ajuste da história da humanidade”. O corte de despesas trouxe resultados, como o primeiro equilíbrio fiscal em 14 anos e o controle da inflação. Mas também custou caro socialmente, gerando protestos e críticas pelo impacto sobre os mais pobres.
Agora, o discurso mudou. No Congresso, Milei anunciou reajuste de 5% acima da inflação para aposentadorias, alta de 17% nos gastos com saúde e de 8% em educação. Programas voltados a pessoas com deficiência também terão incremento de 5% acima da inflação.
Segundo analistas, o tom mais sereno e moderado do presidente buscou sinalizar uma autocrítica e reposicionamento diante das urnas. O economista Juan Manuel Telechea avaliou que Milei reconhece, ainda que indiretamente, que “o ajuste tem limites”.
Cenário político e pressão eleitoral
O anúncio acontece em meio a um cenário político turbulento. A derrota em Buenos Aires fortaleceu o peronismo e trouxe risco de enfraquecimento da coalizão governista no Congresso. A oposição, liderada por Axel Kicillof, acusa Milei de abandonar promessas e de ter atingido aposentados e trabalhadores em vez de combater apenas a “casta”.
Na Argentina, as eleições legislativas de 26 de outubro podem redefinir a correlação de forças no Parlamento. Pesquisas recentes já mostram queda da confiança no governo, antes mesmo de novos escândalos de corrupção envolvendo a gestão.
No mercado, a reação foi imediata: ações argentinas recuaram em Wall Street e em Buenos Aires, enquanto o dólar disparou e o risco país aumentou. Para investidores, o movimento indica mais incerteza.
Riscos para o orçamento de 2026
Segundo Milei, o orçamento do próximo ano prevê crescimento de 5% do PIB, inflação anual de 10,1% e superávit de 1,4% do PIB. A meta inclui ainda um valor médio do dólar de 1.423 pesos, abaixo da cotação atual.
Economistas, porém, veem dificuldades. Juan Luis Bour, da Fiel, alerta que os aumentos de despesas precisarão ser compensados com cortes em outras áreas, já que o equilíbrio fiscal permanece “inegociável”, segundo o próprio Milei.
O desafio, portanto, será manter o discurso da responsabilidade fiscal enquanto se ampliam gastos sociais em pleno ano de pressões políticas. A dúvida que paira é se a guinada agradará o eleitorado sem minar a confiança dos investidores.