
- Empresas como ZAMP, Kora Saúde e Atom Empreendimentos registraram quedas superiores a 90% do pico até o preço da OPA.
- Número de OPAs cresce enquanto nenhum IPO ocorre desde 2022, em meio a Selic de 15% e ações descontadas.
- Novas regras da CVM simplificam o processo e podem acelerar o fechamento de capital na B3.
As Ofertas Públicas de Aquisição (OPAs) voltaram a dominar o noticiário corporativo em 2025, mas desta vez com um impacto amargo para o investidor. Levantamento mostra que ações de empresas que saíram da B3 chegaram a cair mais de 90% entre o pico histórico e o preço oferecido nas ofertas.
Nesse sentido, o cenário de juros elevados e valuations deprimidos tem incentivado companhias a deixar o mercado. Ao mesmo tempo, as novas regras da CVM, em vigor desde outubro, tornam o processo de fechamento de capital mais simples e previsível.
Investidores sofrem com desvalorização extrema
Entre as empresas que protagonizaram OPAs neste ano estão ZAMP (ZAMP3), Kora Saúde (KRSA3), Eletromidia (ELMD3) e Serena Energia (SRNA3). O levantamento do E-Investidor, com base em dados da CVM e Economatica, mostra que a ZAMP chegou a valer R$ 23,53 em 2019, mas teve OPA concluída a apenas R$ 3,50, queda de 85%.
Já a empresa Kora Saúde perdeu 89,2% do valor desde 2021, e a Serena Energia, 38%.
Essa disparidade mostra como ações baratas na Bolsa criam oportunidades para acionistas controladores recomprar o capital a preços muito inferiores aos observados nos anos de pico.
Boom de OPAs e fim dos IPOs
Segundo a consultoria Seneca Evercore, entre 2016 e 2021 o preço/lucro médio do Ibovespa (P/L) era de 13,5 vezes, e houve apenas 8 OPAs no período. Já entre 2022 e 2025, o múltiplo médio caiu para 7 vezes, enquanto o número de ofertas saltou para 17, uma média de 4,5 por ano.
“O aumento das OPAs tem forte correlação com a queda nos múltiplos de avaliação das empresas listadas”, explica Daniel Wainstein, sócio-fundador da Seneca Evercore. “O controlador deixa de ver vantagem em manter a companhia aberta e aproveita o desconto para recomprar ações.”
Desde 2022, a B3 não registra nenhum IPO, reflexo de juros altos, apetite menor por risco e janela fechada para novas listagens. Ao contrário, o número de empresas que encerram o registro vem crescendo de forma constante.
Efeito dos juros e da euforia passada
A Selic, que era de 2% ao ano em 2021, chegou a 15% em 2025, alterando completamente o ambiente de negócios. O custo do capital subiu, os lucros caíram e o valor das empresas despencou.
Wainstein lembra que o atual ciclo de OPAs também reflete o excesso de IPOs durante os anos de euforia. Entre 2020 e 2021, 74 companhias abriram capital. Hoje, ao menos dez já saíram da Bolsa, incluindo casos como GetNinjas (NINJ3) e Toky (TOKY3).
“Muitas dessas empresas nasceram sem estrutura sólida. IPOs mal precificados acabam se tornando OPAs no futuro”, explica Marcos Crivelaro, professor de finanças da Fundação Vanzolini. “Algumas perderam mais de 90% do valor de mercado em apenas quatro anos.”
CVM flexibiliza regras e acelera processos
As Resoluções CVM 215 e 261, em vigor desde 1º de outubro de 2025, substituíram a antiga norma de 2001 e simplificaram o arcabouço das OPAs. As novas regras permitem, por exemplo, dispensa do laudo de avaliação quando houver parâmetros objetivos de preço justo, e acúmulo de processos de aquisição de controle e cancelamento de registro.
Outra mudança é a flexibilização do quórum de aceitação para empresas com baixo free float, que agora precisam apenas de maioria simples, em vez dos dois terços exigidos anteriormente.
“É um avanço em termos de segurança jurídica e previsibilidade”, diz Vinicius Melo Santos, advogado do Lopes Muniz Advogados. “Por outro lado, há o risco de que essa simplificação estimule novas saídas da Bolsa, em um momento em que há poucas aberturas de capital.”
Proteção aos minoritários e debate aberto
Apesar da flexibilização, especialistas afirmam que as normas mantêm a proteção aos investidores minoritários. A CVM continuará exigindo transparência no preço e supervisão direta sobre os processos.
Ademais, segundo Ronaldo Assumpção Filho, do escritório Miguel Neto Advogados, a dispensa do laudo de avaliação só vale quando o preço é lastreado por transações recentes e referências de mercado objetivas. “É uma simplificação, não uma liberação. Os acionistas seguem amparados pela CVM e pelo direito de contestar valores em instâncias administrativas e judiciais”, afirma.
Mesmo assim, o consenso é que o ambiente regulatório mais flexível deve tornar as OPAs mais rápidas e baratas, o que tende a aumentar o ritmo de fechamento de capital nos próximos meses.