
- Risco de Selic acima de 12% em 2026 caso gastos eleitorais ampliem a pressão inflacionária.
- Tarifas dos EUA e câmbio acima de R$ 6,50 podem agravar o cenário.
- Sem ajuste fiscal, juros longos permanecem altos, travando investimento e crescimento.
A manutenção da Selic em 15% pelo Comitê de Política Monetária (Copom) reacendeu as projeções para o início do ciclo de cortes, que podem começar entre dezembro de 2025 e o primeiro trimestre de 2026. No entanto, especialistas afirmam que a trajetória da taxa no próximo ano dependerá do fôlego fiscal do governo e de eventuais pressões eleitorais.
Estudo da consultoria Outpod, do economista Carlos Honorato, aponta que a Selic pode encerrar 2026 em 9,5% no cenário otimista ou acima de 12% no pessimista. A variação estará diretamente ligada à postura do governo sobre gastos e ao impacto dessa política na inflação e no crescimento econômico.
Fiscal expansionista e seus efeitos
O aumento de despesas federais, incluindo benefícios sociais e reajuste real do salário mínimo, tende a estimular o consumo, elevando a pressão sobre preços. Com mais dinheiro circulando, a demanda por alimentos e serviços cresce, tornando o controle da inflação mais difícil apenas com política monetária.
A solução defendida pelo governo tem sido ampliar a arrecadação, como no caso do aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). No entanto, o mercado critica essa abordagem e defende cortes de gastos para evitar maior deterioração fiscal. Projeções da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado indicam que a dívida bruta pode chegar a 84% do PIB, subindo para 85% em caso de estímulo extra em ano eleitoral.
Para Honorato, o problema central está na trajetória de alta da dívida e na ausência de ações concretas para conter despesas. “Não é uma situação catastrófica, mas também não é positiva. O que agrava o cenário é não haver um movimento real de corte de gastos”, afirma.
Inflação elevada e incerteza política
A consultoria estima inflação entre 5% e 5,5% no cenário base, podendo atingir 6% a 6,5% no pior caso. Isso exigiria que o Banco Central mantivesse os juros acima de 10,5% por mais tempo, encarecendo o crédito e desacelerando a economia.
Assim, segundo Rafaela Vitoria, economista-chefe do Inter, o risco é de que novos aumentos de gastos mantenham a inflação acima da meta, reduzindo o espaço para cortes de juros. “Mesmo com juros reais próximos a 10% na Selic ex-ante, as expectativas seguem desancoradas”, avalia.
Outro fator de incerteza é a mudança na diretoria do BC em 2026. Portanto, com a saída de dois membros do Copom, o presidente Lula passará a indicar toda a cúpula monetária, o que pode gerar dúvidas sobre a condução da política monetária em ano eleitoral.
Pressões externas e impacto cambial
Além do cenário interno, fatores externos ameaçam o equilíbrio econômico. As tarifas de 50% impostas pelos Estados Unidos às exportações brasileiras devem continuar em 2026 e podem até ser ampliadas.
Além disso, esse movimento tende a reduzir a competitividade da indústria nacional, afetar o saldo comercial e provocar desvalorização do real frente ao dólar. Com isso, insumos importados ficam mais caros, pressionando ainda mais a inflação doméstica.
Desse modo, para Honorato, o desafio do BC será lidar com choques externos e internos simultaneamente. “A combinação de expansão fiscal e tarifas internacionais pode exigir juros altos por um período mais prolongado”, avalia.
Perspectivas para além de 2026
A Outpod projeta que os efeitos de uma política fiscal expansionista em 2026 podem se estender nos anos seguintes, com risco de ressurgimento inflacionário entre 2030 e 2037.
Nesse cenário, um novo ciclo de aperto monetário prolongado seria necessário, comprometendo o crescimento sustentável no longo prazo. “As taxas reais de 10 anos estão acima de 7% desde o final do ano e não devem cair sem sinais claros de responsabilidade fiscal e estabilidade institucional”, afirma Jeferson Bittencourt, economista do ASA.
Por fim, a leitura dos analistas é clara: sem ajuste fiscal robusto, os juros longos permanecerão elevados, encarecendo o financiamento, desestimulando investimentos e limitando a capacidade de crescimento do país.