O déficit primário das empresas estatais brasileiras atingiu R$ 7,76 bilhões no acumulado de janeiro a outubro de 2024, marcando o pior resultado para o período desde o início da série histórica do Banco Central (BC), em 2002. O valor é quase três vezes superior ao prejuízo de R$ 2,86 bilhões registrado no mesmo intervalo de 2023. As informações são do portal Poder360.
Os números divulgados pelo BC não consideram gigantes como Petrobras, Eletrobras e instituições financeiras públicas, incluindo Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.
Federais lideram déficits
As empresas estatais federais concentraram o maior impacto negativo, somando R$ 4,452 bilhões até outubro. Em 2023, o déficit dessas companhias foi de apenas R$ 286 milhões no mesmo período. Especialistas apontam que o crescimento reflete o aumento de investimentos.
O economista Gustavo Almeida explica que “os gastos elevados em infraestrutura e projetos de modernização são positivos a longo prazo, mas pesam significativamente no curto prazo”.
Já as estatais estaduais apresentaram um déficit de R$ 3,355 bilhões, um salto em relação aos R$ 2,257 bilhões de 2023. As estatais municipais, no entanto, tiveram uma melhora, registrando um superávit de R$ 41,6 milhões, revertendo o déficit de R$ 325 milhões observado no ano anterior.
Ações trabalhistas e os Correios
O desempenho negativo das estatais federais foi agravado por decisões controversas. Como destacou o Poder360, os Correios desistiram, em abril de 2023, de recorrer de uma ação trabalhista no valor de R$ 614 milhões que tramitava no Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Fabiano Silva dos Santos, presidente da estatal, optou por contabilizar o passivo milionário no balanço de 2022, atribuindo o prejuízo à gestão anterior, do governo de Jair Bolsonaro. A decisão foi tomada sem parecer jurídico ou consulta à Advocacia-Geral da União (AGU).
“Esse tipo de conduta, sem respaldo técnico ou jurídico, levanta suspeitas sobre a transparência da gestão pública”, afirmou o procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MP-TCU), Marcos Vieira, que solicitou a investigação sobre possível “manobra fiscal” nos Correios.
Uma segunda ação, avaliada em R$ 409 milhões e julgada em outubro de 2022, também foi inserida nas contas retroativas da gestão anterior, embora o pagamento não tenha sido realizado à época.
Impactos e reflexões
O aumento expressivo do déficit levanta questionamentos sobre a eficiência e transparência na administração de estatais no Brasil. Embora o investimento em infraestrutura seja essencial, a falta de planejamento financeiro pode comprometer a sustentabilidade dessas empresas.
Por outro lado, a deterioração das contas federais reforça a necessidade de reformas. Com o encerramento do ano fiscal se aproximando, as expectativas para 2025 são desafiadoras. A previsão é de continuidade nos altos investimentos, especialmente em áreas estratégicas, mas especialistas pedem atenção aos gastos.
O relatório do BC reforça a complexidade de administrar estatais em um cenário de altos déficits, ao mesmo tempo que evidencia avanços pontuais em alguns níveis de gestão.
O que diz o Governo:
O MGI (Ministério da Gestão e Inovação) afirmou, ao jornal Valor Econômico , que o défice primário não reflete, isoladamente, a saúde financeira das empresas estatais, mas considera apenas receitas e despesas primárias do ano corrente, sem incluir os recursos em caixa acumulada em períodos anteriores.
“As empresas podem registrar déficits primários mesmo com lucro contábil, especialmente quando estão intensificando investimentos na expansão ou modernização de seus negócios” .
segundo o MGI.
Das 13 empresas evidenciadas pelo BC, 10 tiveram lucro contábil, segundo o ministério. “Os déficits fiscais atuais das estatais refletem a retomada de investimentos. Não há risco às contas públicas, pois não depende do transporte do Tesouro, sendo financiados com recursos próprios das estatais” , afirmou.
Conforme o MGI, as estatísticas registraram lucro líquido de quase R$ 200 bilhões em 2023, embora o resultado represente uma queda de 28% em relação ao ano anterior.
“No ano passado, as empresas estatais repassaram R$ 128 bilhões em dividendos e juros sobre capital próprio a seus acionistas. Deste montante, cerca de R$ 50 bilhões foram destinados diretamente ao Tesouro Nacional.”