
- Decreto de Lula regulamenta lei que permite retaliações comerciais, mas sem citar os EUA.
- Tarifa de 50% de Trump atinge diretamente exportações brasileiras.
- Governo brasileiro evita confronto direto e aposta em solução diplomática.
Quatro dias após o anúncio de uma tarifa de 50% por parte do ex-presidente Donald Trump sobre produtos brasileiros, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva publicou, sem alarde, um decreto que regulamenta a chamada “lei da reciprocidade”. A medida permite ao Brasil impor restrições comerciais a países que adotem práticas discriminatórias contra seus produtos.
Apesar do momento e do conteúdo da norma, o governo fez questão de evitar qualquer menção direta aos Estados Unidos ou à tarifa imposta por Trump. Nos bastidores, no entanto, o decreto é visto como um recado sutil de que o Brasil está juridicamente preparado para reagir, caso a via diplomática não avance.
O decreto 12.068, publicado na última segunda-feira (15), autoriza os ministérios do Desenvolvimento, Relações Exteriores e Agricultura a recomendar medidas contra países que prejudiquem o comércio brasileiro. A edição do texto pegou de surpresa até mesmo setores do governo e do agronegócio, que esperavam uma postura mais incisiva do Planalto após o tarifazo norte-americano.
Governo fala em “ferramenta técnica”, mas mira cenário global
Segundo interlocutores do Planalto ouvidos pela imprensa, a publicação do decreto busca apenas “atualizar a legislação brasileira”, mas, na prática, fortalece o poder do Executivo em adotar retaliações quando necessário. A regulamentação era uma demanda antiga do Itamaraty e não se limitaria ao episódio com os EUA, mas também a tensões comerciais com a União Europeia e outros mercados.
Ainda assim, o timing da medida levanta dúvidas. A regulamentação da lei nº 9.019, de 1995 — que trata das práticas desleais no comércio internacional — ocorre justamente quando o Brasil vê suas exportações ameaçadas por uma postura mais agressiva de Washington, principalmente após a reaproximação brasileira com países como China, Rússia e Irã.
A chamada “lei da reciprocidade” já existia, mas nunca havia sido formalmente detalhada por decreto presidencial. A nova norma permite, por exemplo, que o Brasil suspenda isenções fiscais, cobre taxas extras ou limite a entrada de produtos estrangeiros, caso detecte prejuízos a seus interesses.
Brasil evita retaliação imediata e insiste em solução diplomática
Apesar da nova regulamentação, o governo Lula tem reforçado que, por ora, não pretende retaliar diretamente os EUA. Segundo fontes do Itamaraty e do Ministério da Fazenda, o Brasil segue apostando em um entendimento diplomático e não quer alimentar tensões com os norte-americanos — principalmente em meio ao ano eleitoral nos Estados Unidos.
Aliados do presidente avaliam que uma reação direta poderia escalar o conflito e prejudicar ainda mais setores importantes da economia brasileira, como o agronegócio, já altamente dependente do mercado externo. Além disso, há receio de que qualquer movimento brusco seja explorado por Trump como justificativa para endurecer ainda mais seu discurso eleitoral.
O próprio Lula tem evitado comentar o tema publicamente. A estratégia do Planalto é manter a temperatura baixa e buscar apoio de entidades multilaterais, como a OMC, para contestar as tarifas impostas, caso elas sejam efetivamente aplicadas — algo que ainda depende da vitória de Trump nas eleições de novembro.