
A decisão do Congresso Nacional de derrubar o decreto que elevava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) mergulhou o Orçamento de 2025 em uma nova zona de incerteza.
Considerada estratégica pela equipe econômica para fechar as contas do ano, a medida tinha potencial de garantir até R$ 10 bilhões em arrecadação adicional, mas foi rejeitada pelo Legislativo na última quarta-feira (25), expondo uma fragilidade crescente na relação entre governo e parlamentares.
Segundo especialistas em contas públicas, a revogação do decreto deve obrigar o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a ampliar bloqueios e contingenciamentos de gastos, que já somam R$ 31,3 bilhões — o maior valor em cinco anos.
A medida afeta diretamente os chamados gastos discricionários, como investimentos e custeio da máquina pública.
“O governo já havia feito um corte expressivo. Com essa nova perda de receita, será inevitável ampliar ainda mais o contingenciamento”, alerta Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos e ex-secretário da Fazenda de São Paulo.
Para ele, o impacto pode ultrapassar R$ 15 bilhões, gerando efeito cascata sobre ministérios e políticas públicas.
Efeito dominó: menos receita, mais cortes, menor confiança
A medida derrubada era considerada essencial para viabilizar a meta de déficit zero em 2025.
O texto fazia parte do esforço da Fazenda para equilibrar o orçamento sem abrir mão das despesas obrigatórias, num ambiente em que cortar gastos virou tabu político.
“O grande problema não é só o IOF em si. É o recado que isso passa: não há espaço para ajuste estrutural. E o mercado sabe disso”, afirma André Galhardo, da consultoria Análise Econômica.
Ele aponta que a falta de medidas duradouras para controle das despesas — como mudanças na correção do salário mínimo, nas emendas parlamentares e nos pisos constitucionais — é o que mais pressiona a dívida pública, que já atinge 76,2% do PIB.
A leitura no mercado é de que a derrubada do decreto representa um enfraquecimento da credibilidade fiscal do governo, o que pode resultar em alta do dólar, aumento da percepção de risco e elevação dos juros futuros.
Isso sem contar a possibilidade de o Executivo ser forçado a revisar oficialmente a meta fiscal, algo que os economistas consideram cada vez mais provável.
“Estão brincando com fogo”
Para Salto, a situação é grave e revela uma disfunção entre Executivo e Legislativo. “O quadro fiscal é sério e estão brincando com fogo.
A Câmara age movida pelo receio de perder emendas bilionárias, enquanto o governo evita o desgaste de propor cortes reais.”
Mesmo a alternativa de recompor parte da perda via aumento de outros tributos — como os previstos em Medida Provisória que taxa criptoativos, apostas e investimentos — enfrenta resistência crescente no Congresso.
Marcos Praça, da Zero Markets Brasil, vai além: “O governo está engessado. E, com eleições em 2026, a tendência é o Congresso travar ainda mais qualquer tentativa de ajuste fiscal.”
A percepção é compartilhada por Harrison Gonçalves, do CFA Society Brazil, que vê na decisão do Parlamento um recado claro: “É hora de cortar gastos, não de aumentar impostos”.
Sem IOF, o que está em jogo
Sem o IOF, sem cortes e sem apoio político para novas fontes de arrecadação, o governo corre contra o tempo para evitar uma paralisia orçamentária.
A estimativa é que, mesmo com medidas compensatórias já anunciadas, ainda haja um buraco de R$ 25 bilhões nas contas de 2025.
E o maior problema pode estar mais adiante. Para 2026, as projeções de desequilíbrio são ainda mais severas — o que pode forçar uma revisão do arcabouço fiscal, afetar a trajetória da dívida pública (com estimativas de que ela chegue a 93,5% do PIB em 2034) e prejudicar o grau de confiança do país nos mercados internacionais.