Guia do Investidor
imagem padrao gdi
Notícias

Como a reforma tributária pode ser uma bandeira branca na guerra fiscal

Nos siga no Google News

Continua após o anúncio

Entre as muitas guerras que estudamos durante a vida escolar, pouco se fala de uma das que mais impacta o cotidiano brasileiro: a guerra fiscal. E não falta material: o Brasil tem 27 lados diferentes lutando entre si.

Essa disputa acontece em função da estrutura federativa e do regime tributário em vigor. Os estados detêm competência para instituir e gerir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), estabelecendo suas alíquotas e concedendo isenções, incentivos e benefícios fiscais, e transformando isso em um componente competitivo na atração de investimentos.

Um estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) mapeou o tema nos 27 estados do país. A análise da alíquota média paga em cada região constatou que Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina possuem o menor percentual de rendimentos tributáveis pagos ao governo, com 4,7%, 5,32% e 5,6% respectivamente. Já do outro lado aparecem Estados como Bahia, Piauí, Alagoas e Ceará, que possuem hoje a maior carga para as empresas.

Leia mais  Reforma Tributária faz crescer em 300% a busca por recuperação de notas fiscais

Os benefícios fiscais podem incluir, por exemplo, reduções na carga tributária por meio das alíquotas, ou com créditos presumidos de ICMS; além de regimes especiais de apuração e diferimentos do lançamento do imposto; e financiamentos com juros mais baixos através das agências de fomento estaduais.

É notável que a concorrência contribui para o crescimento econômico, geração de empregos e ampliação da base tributária, movimentando a economia local, além de impulsionar a inovação em políticas públicas, como a melhoria da infraestrutura, o investimento em educação e formação de mão de obra, entre outros.

No entanto, há impactos negativos significativos, como a exacerbada desigualdade regional. Quando os estados dotados de maior capacidade para ofertar incentivos fiscais atraem uma quantidade desproporcional de investimentos, isso aprofunda a disparidade econômica com os estados menos favorecidos.

Outro ponto crucial é a perturbação do equilíbrio fiscal. A redução de impostos para atrair investimentos pode levar a uma queda significativa na arrecadação de receitas, prejudicando o orçamento público e limitando a capacidade do estado de prover serviços essenciais à população.

Além disso, existe a possível submissão do poder público a interesses empresariais e a potencial negligência dos interesses da população local. Se as autoridades públicas se virem obrigadas a manter constantemente esses incentivos fiscais, isso ameaçaria a saúde financeira do estado e comprometeria a sua capacidade de investimento em áreas-chave, como saúde, educação e infraestrutura.

Leia mais  Reforma Tributária - A tecnologia se tornou essencial

E claro que não dá para ignorar o pior efeito colateral: incentivos sem a devida transparência e sem o adequado controle público, o que abre espaço para práticas de corrupção e favorecimento indevido.

Ainda nesse ângulo, a população local também pode ser afetada, à medida em que os recursos que deveriam ser destinados a serviços públicos essenciais são direcionados para atrair investimentos que nem sempre geram o desenvolvimento prometido.

Um campo minado

Além da disputa entre os estados, nem mesmo o terreno de batalha é seguro para eles. A concessão de benefícios fiscais deve obedecer a certos critérios e limites estabelecidos pela legislação, especialmente o Convênio ICMS 24/1975 e a Lei Complementar nº 24/1975, que permite isenções, incentivos e benefícios fiscais. Ou seja, quando os estados oferecem suas próprias isenções, estão atuando numa área legalmente ambígua, o que pode levar a contestações e disputas jurídicas.

Ademais, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), órgão que reúne os Secretários de Fazenda de todos os estados e do Distrito Federal, precisa aprovar, de forma unânime, qualquer concessão de benefício fiscal relativo ao ICMS. Logo, benefícios concedidos sem essa aprovação são considerados ilegais.

É nesse fogo cruzado que a reforma tributária poderia funcionar como uma bandeira branca ao reestruturar o sistema e eliminar – ou ao menos reduzir – as discrepâncias e as iniquidades que incentivam a guerra fiscal. Com a possível unificação de certos impostos e diminuição das diferenças entre as alíquotas estaduais, o campo também se tornaria mais estável para todos.

Leia mais  Reforma tributária: recomplicaram a proposta simples

A reforma poderia também estabelecer regras mais claras e estritas quanto à concessão dos benefícios. Uma regulação mais sólida possibilitaria reduzir práticas desleais e garantir um tratamento mais equânime entre as unidades federativas.

Resta saber se todos os estados estão dispostos a respeitar a bandeira branca ao mesmo tempo e se saberão seguir sem o ruído de “guerra” ao qual se acostumaram.

Por Leonardo Roesler, advogado especialista em Direito Tributário e Empresarial, pela FGV, Ohio University nos Estados Unidos e Universidade de La Rioja, na Espanha, e sócio-fundador da RMS Advogados, com escritórios em São Paulo, Miami e Joinville.


Nos siga no Google News

DICA: Siga o nosso canal do Telegram para receber rapidamente notícias que impactam o mercado.

Leia mais

Imposto zero no consumo e taxação dos super-ricos, propõe ministro do turismo

Rodrigo Mahbub Santana

Appy diz que acredita na aprovação da Reforma Tributária até o fim do ano, apesar do “prazo curto”

Paola Rocha Schwartz

Votação da indicação de Galípolo no Senado pode ocorrer apesar da pauta trancada

Paola Rocha Schwartz

O papel do contador na Reforma Tributária

Charles Gularte

Reforma tributária vai aumentar preço de 600 mil produtos

Guia do Investidor

Brasil terá maior imposto do mundo com reforma tributária

Paola Rocha Schwartz

Deixe seu comentário