
- Déficit externo de maio foi o maior desde 2022, somando US$ 2,93 bilhões, puxado por queda na balança comercial.
- Investimento direto em alta alivia pressão, mas saída de capitais e cenário global mantêm risco de deterioração.
- Austin Rating projeta déficit de US$ 57,7 bilhões em 2025, mas descarta risco de solvência externa no curto prazo.
As contas externas do Brasil voltaram ao centro das atenções em maio. O déficit nas transações correntes alcançou US$ 2,93 bilhões, o maior para o mês desde 2022, segundo dados divulgados pelo Banco Central. O resultado representa uma alta de 16,3% em relação a maio de 2024 e reforça preocupações com o ritmo de deterioração dos indicadores externos.
Embora a balança comercial ainda apresente superávit, o saldo caiu para US$ 6,62 bilhões — abaixo das expectativas. Ao mesmo tempo, os déficits persistentes em serviços (US$ 4,71 bilhões) e em renda primária (US$ 5,15 bilhões) ajudam a empurrar o resultado para o vermelho. No acumulado de 12 meses, o saldo negativo chegou a US$ 69,4 bilhões, equivalente a 3,26% do PIB, contra 1,3% um ano antes.
Entrada de investimento direto ajuda, mas não reverte quadro
Apesar do déficit crescente, o Investimento Direto no País (IDP) funcionou como amortecedor importante. Em maio, o ingresso foi de US$ 3,7 bilhões, superando os US$ 3 bilhões registrados no mesmo mês de 2024. No acumulado de 12 meses, o IDP atingiu US$ 70,5 bilhões, equivalente a 3,31% do PIB — um valor suficiente, em tese, para cobrir o déficit em conta corrente.
Contudo, analistas veem riscos na tendência. O economista-chefe da Austin Rating, Alex Agostini, destaca que, embora o número final tenha vindo melhor do que o esperado, o cenário é de alerta. “A nossa projeção era de um déficit acima de US$ 5 bilhões, então houve surpresa positiva. Mas o ritmo de piora ao longo do ano preocupa”, afirmou.
Segundo ele, a queda na balança comercial tem ligação direta com a desaceleração de economias como Estados Unidos e China, além da própria demanda interna fraca. Isso, combinado com um déficit estável na conta de serviços, mantém o quadro pressionado.
Saída de capitais expõe vulnerabilidade fiscal
Outro ponto levantado por Agostini é a crescente saída líquida de capitais, resultado da combinação entre incertezas fiscais domésticas e os juros altos nos Estados Unidos, que tornam ativos brasileiros menos competitivos no cenário global. A conta financeira mostra que, mesmo com juros elevados por aqui, o investidor estrangeiro permanece cauteloso.
“O mercado brasileiro segue atrativo no papel, mas o ambiente fiscal ainda instável afasta decisões mais robustas”, avaliou o economista. Ele lembra que, embora o IDP esteja em recuperação, o capital de curto prazo ainda flui para fora do país, o que amplia a fragilidade cambial.
A relação entre transações correntes e PIB, hoje em torno de 2,8%, ainda é considerada administrável. No entanto, a projeção da Austin Rating para o fim de 2025 é de um déficit de US$ 57,7 bilhões, cerca de 2,6% do PIB. O número ainda está dentro dos padrões de solvência externa, mas evidencia um cenário em deterioração.
“Sem risco de solvência, mas com alerta ligado”, diz Austin
Apesar dos sinais negativos, Agostini descarta um risco imediato de crise externa. Para ele, o país ainda tem reserva internacional sólida, acesso a financiamento e espaço para políticas de correção. “Não há risco de solvência. A capacidade de pagamento em moeda estrangeira segue preservada”, reforçou.
Ainda assim, o economista alerta que ações estruturais são necessárias. A redução da dependência de superávits comerciais e a busca por maior estabilidade fiscal são caminhos que o governo precisa percorrer com urgência. “A conta externa é sensível ao humor do investidor. E esse humor depende, em grande parte, de previsibilidade econômica”, concluiu.
A avaliação da Austin se soma a outras que apontam 2025 como um ano chave para a política econômica. Com cenário global incerto e desafios internos persistentes, o equilíbrio das contas externas será um dos principais termômetros da confiança no Brasil.