
- Arrecadação da Ambec saltou de R$ 135 para R$ 14,9 milhões em um ano.
- A entidade realizou descontos sem autorização, e as vítimas sequer a conheciam.
- PF investiga ao menos 12 associações em esquema nacional de fraudes no INSS.
Uma entidade quase desconhecida do grande público se tornou protagonista de um escândalo que pode ter lesado milhões de aposentados. Em apenas um ano, a Associação Mutualista para Benefícios Coletivos (Ambec) viu sua arrecadação saltar de R$ 135 para R$ 14,9 milhões, um crescimento de impressionantes 11 milhões por cento, segundo a Polícia Federal (PF). O dado, que integra o relatório da operação “Sem Desconto”, expõe um esquema de descontos irregulares em benefícios previdenciários do INSS.
A apuração revelou que de 2019 a 2024, o faturamento total da Ambec chegou a R$ 178 milhões, mesmo sendo uma associação que, para muitos dos atingidos, sequer existia. O número chamou a atenção da Controladoria-Geral da União (CGU), que realizou auditoria na entidade. O resultado agravou ainda mais o cenário: não há comprovação legal dos descontos.
Aposentados vítimas e sem respostas
De acordo com o relatório da CGU, os aposentados afetados pela cobrança indevida “desconhecem por completo” a Ambec. Muitos sequer sabiam que estavam filiados à associação, tampouco que mensalidades estavam sendo descontadas diretamente dos seus benefícios. Essa prática, segundo os investigadores, configura grave violação de direitos.
Apesar disso, os representantes legais da Ambec negam qualquer irregularidade. Em nota assinada pelos advogados Daniel Bialski e Bruno Borragine, a defesa afirma que a associação “não praticou a atividade ostensiva de captação ou afiliação” dos aposentados. Para eles, a responsabilidade recairia sobre correspondentes bancários (Corbans), que teriam atuado de forma indevida.
Mesmo com essa justificativa, a ausência de documentação comprobatória e o volume expressivo das quantias movimentadas indicam, para as autoridades, fortes indícios de fraude. Além disso, nomes como Maurício Camisotti e Antônio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, aparecem ligados à entidade, o que intensificou a apuração.
Esquema em rede e outras entidades suspeitas
O caso da Ambec, no entanto, não é isolado. Segundo a PF, outras 11 entidades estão sob investigação. Todas são suspeitas de atuar em rede para aplicar descontos sistemáticos em aposentadorias e pensões. Entre elas estão o Cebap, a CBPA e a CAAP, além de associações com nomes semelhantes, que sugerem, propositalmente, vínculos com serviços públicos.
Essas instituições, segundo os investigadores, utilizavam cadastros obtidos de forma irregular, muitas vezes sem o consentimento dos beneficiários, para realizar os descontos. O padrão se repetia: valores pequenos, que passavam despercebidos, mas que somados geravam milhões em arrecadação mensal.
A operação Sem Desconto, deflagrada em 23 de abril, cumpriu 211 mandados de busca e apreensão e seis de prisão temporária em 13 estados e no Distrito Federal. As investigações continuam e novas fases não estão descartadas, segundo a PF.
Impactos e a reação dos órgãos públicos
A revelação do escândalo repercutiu fortemente entre os órgãos de controle, que prometeram reforçar as auditorias em parcerias com entidades privadas. O próprio INSS anunciou que está revisando milhares de contratos de associação, sobretudo os que não possuem registro formal de autorização dos aposentados.
Paralelamente, o Ministério da Previdência informou que vai criar um canal exclusivo para que beneficiários possam contestar descontos e denunciar cobranças indevidas. A ideia é evitar que o rombo se amplie e que mais idosos sejam prejudicados.
Apesar do avanço nas investigações, ainda há muita insegurança entre os aposentados. Muitos temem que valores não sejam devolvidos e questionam a fragilidade dos sistemas de controle do INSS. As próximas etapas da operação podem, portanto, determinar os rumos da responsabilização dos envolvidos e o início da reparação às vítimas.