
- Discurso e prática de Lula sobre democracia entraram em choque com a viagem a Moscou.
- Justificativas econômicas e diplomáticas não convenceram especialistas nem parceiros internacionais.
- A imagem do Brasil no cenário democrático global foi comprometida pela associação com autocracias.
A ida do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao desfile militar na Rússia ao lado de líderes autoritários reabriu questionamentos sobre sua real fidelidade aos princípios democráticos. O contraste entre o discurso pró-democracia e os gestos políticos fora do país levanta dúvidas sobre coerência e prioridades na política externa do Brasil.
Contradições entre discurso e prática
A presença de Lula ao lado de líderes como Vladimir Putin, Nicolás Maduro e Abdel Fattah el-Sisi, durante as comemorações dos 80 anos da vitória na Segunda Guerra, gerou desconforto em setores da sociedade. O evento, promovido em Moscou, serviu mais como vitrine para autocracias do que como celebração histórica.
Embora o presidente brasileiro se diga defensor da democracia, sua participação ao lado de chefes de Estado acusados de violações de direitos humanos despertou críticas. Especialistas apontam que Lula tem adotado posturas ambíguas: enquanto afirma ter defendido o regime democrático no 8 de janeiro, aparece confraternizando com figuras que negam esses valores em seus países.
O professor de relações internacionais Vitelio Brustolin, da Universidade Federal Fluminense, resumiu o incômodo: “Lula se elegeu com um discurso democrático e aparece com ditadores e criminosos de guerra. Isso enfraquece sua narrativa.” A incoerência entre o discurso doméstico e os atos internacionais preocupa também entidades de direitos humanos no Brasil.
Justificativas não convencem
Diante das críticas, o presidente buscou justificar sua viagem sob vários argumentos. O primeiro foi econômico: o Brasil acumula um déficit de quase US$ 11 bilhões com a Rússia, principalmente devido à importação de diesel e fertilizantes. A visita seria, segundo ele, parte de um esforço diplomático para equilibrar essa balança. Ainda assim, críticos apontam que a viagem transmite sinais equivocados ao restante da comunidade internacional.
Outro motivo alegado foi o desejo de firmar acordos estratégicos com Moscou. No entanto, especialistas apontam que essas parcerias normalmente envolvem países com regimes autoritários, como Irã, Coreia do Norte e Venezuela. Isso reforça a impressão de que o Brasil estaria se afastando do eixo democrático internacional.
Além disso, Lula declarou que atua como “amigo da paz” em meio à guerra entre Rússia e Ucrânia. Mas diplomatas e analistas internacionais lembram que o Brasil não tem assento no Conselho de Segurança da ONU, nem foi convidado por Kiev para mediar as negociações. A isenção brasileira, inclusive, é vista com ceticismo pela Ucrânia, que considera Lula próximo demais de Putin.
Reações internas e desgaste internacional
No Brasil, a postura do presidente dividiu opiniões. Enquanto aliados elogiaram a tentativa de manter diálogo com todos os lados, críticos afirmaram que Lula perdeu uma oportunidade de reafirmar o compromisso brasileiro com a democracia. Figuras do Congresso e acadêmicos apontaram que sua participação serviu mais para promover o regime russo do que para garantir avanços para o Brasil.
No exterior, o gesto também repercutiu mal. Diversos líderes democráticos declinaram do convite de Putin, justamente para evitar a associação com um regime acusado de crimes de guerra. Ao optar por comparecer, Lula acabou isolando o Brasil entre os países latino-americanos e gerando atritos com aliados históricos da Europa Ocidental. Parlamentares da oposição, inclusive, apresentaram pedidos de explicação formal ao Itamaraty sobre a escolha diplomática.
Desse modo, embora o presidente tenha tentado minimizar os efeitos políticos da viagem, o saldo foi de enfraquecimento da imagem internacional do Brasil como país defensor da ordem democrática. Portanto, em vez de fortalecer pontes, a presença no desfile em Moscou acentuou distâncias.