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Em mais um capítulo do escândalo envolvendo a empresa –, a Americanas reconheceu, pela primeira vez, que as “inconsistências contábeis” encontradas em seus balanços foram causadas por fraude de R$ 21,7 bilhões em contratos de verba de propaganda cooperada e instrumentos similares. Se considerados os juros, o rombo chega a R$ 25,3 bilhões, o que torna o patrimônio líquido da Americanas negativo em ao menos R$ 10,6 bilhões.
Em fato relevante divulgado também ontem, a responsabilidade é da “diretoria anterior”, segundo assessores jurídicos da empresa. A conclusão se baseou no relatório do comitê independente criado pela Americanas para investigar o assunto e em “documentos complementares identificados pela administração e seus assessores após as reuniões com o comitê”.
Para o advogado e especialista em Direito Bancário, Fabiano Jantalia – sócio-fundador do Jantalia Advogados –, uma das coisas que mais chama a atenção do mercado nesse episódio é, “além das práticas contábeis supostamente inadequadas ou fraudulentas”, a atuação das empresas de auditoria envolvidas.
“Diante do tamanho dessas fraudes, é virtualmente impossível que uma auditoria independente não tenha verificado ao menos indícios de uma prática contábil inadequada numa empresa tão grande quanto as Americanas”, opina.
O especialista ressalta, no entanto, que a atuação dos auditores independentes conta com um robusto conjunto de regras e procedimentos. “Além de observarem o disposto nas normas do Conselho Federal de Contabilidade, do Comitê de Pronunciamentos Contábeis do CFC, o trabalho das auditorias independentes também está sujeito ao disposto na Resolução número 23. de 25/02/21, da Comissão de Valores Mobiliários – que estabelece uma série de regras e obrigações. A grande pergunta que o mercado se faz é: como e por que essas empresas de auditoria independente não verificaram o problema ou a inconsistência?”
Jantalia explica que, segundo a Resolução do CVM, a auditoria deveria ter produzido um relatório circunstanciado sobre os procedimentos contábeis sendo adotados “para verificar se aqueles elementos financeiros estavam sendo corretamente dispostos nas demonstrações financeiras da companhia”. “Além disso”, acrescenta, a norma “estabelece que cabe à auditoria independente indicar as contas e os subgrupos das contas de ativo, passivo, resultado e patrimônio líquido que são afetados pela adoção de procedimentos contábeis que sejam conflitantes com esses princípios fundamentais de contabilidade”. E mais: segundo Jantália, a auditoria “deve estabelecer os efeitos dessas práticas supostamente inadequadas no dividendo obrigatório e no lucro ou prejuízo por ação”.
Por tudo o que foi dito, o especialista considera o caso bastante estarrecedor. “Novamente: chamam atenção não apenas a magnitude da fraude, mas o seu tempo de duração e o seu modus operandi supostamente contínuo. Não se pode fazer um juízo de valor sobre a atuação dessa ou daquela empresa, porque não temos acesso às informações – mas o que já vimos pela imprensa nos coloca um grande ponto de interrogação. Será que essas empresas de auditoria de fato conseguiram cumprir, ou vinham cumprindo com regularidade, com essas obrigações? É essa a grande pergunta que o mercado se faz diante de um fato tão grande e tão duradouro.”
Jantalia ainda observa, porém, que, no âmbito da jurisprudência, nenhuma das normas citadas atribui ao auditor independente a função de “garantidor da inexistência de irregularidade”.
“O trabalho de auditoria, por definição, sobretudo uma companhia grande, é feito por amostragem – mas ela precisa ser feita de maneira a pelo menos contemplar os grandes números que impactam o balanço da companhia.”
Para o especialista, “uma avaliação melhor precisará ser feita pela CVM e provavelmente pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional”. “Mas a obrigação dos auditores independentes precisa ser bem cumprida sob pena de perda da utilidade, da eficácia e até mesmo da credibilidade do trabalho da auditoria independente.”
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