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Trabalho de Cuidado no Brasil: veja o que é, exemplos e se é remunerado

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No domingo, dia 7 de novembro, ocorreu a primeira fase do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Neste, a proposta de redação para os estudantes surge com o seguinte tema: “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil”. Com isso, diversas dúvidas foram postas a tona. Por isso, hoje vamos explicar o que é o trabalho de cuidado no brasil, exemplos destes e se é remunerado.

Em primeiro lugar, além dos comentários positivos e negativos nas redes, foi possível encontrar pessoas que sequer entenderam a proposta. Por exemplo, em respostas a uma publicação do G1 no X (antigo Twitter), há alguns internautas que mostraram suas dúvidas a respeito.

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Trabalho de Cuidado no Brasil: veja o que é, exemplos e se é remunerado

“Eles fazem questão de deixar o título mais difícil do que precisa. A maioria das pessoas não conseguem dizer direito o que é trabalho de cuidado.”, disse um usuário.

“”Invisibilidade do trabalho de cuidado” O que isso quer dizer?”, questionou outra.

“Trabalho de cuidado?? Cuidado de que? Só pra entender o tema já leva meia hora antes de começar a desenvolver a redação. Tema confuso demais!”, disse, expressando suas queixas.

Enfim, outro, de forma mais direta pergunta “O que é trabalho de cuidado?”.

Dessa forma, essas são algumas das dúvidas que surgiram diante desse tema que, apesar de confuso para alguns, mostra-se de discussão necessária. Pois, se as pessoas não sabem o que é trabalho de cuidado no Brasil, isso já nos entrega a sua própria falta de visibilidade.

Mas então, o que é trabalho de cuidado?

Primeiro, cabe entender a palavra cuidado” por si só. Cuidado é um adjetivo que indica algo que recebe atenção, bom trato, zelo. Além disso, vem do ato de cuidar, ou seja, tratar, garantir o bem estar e segurança… enfim, há uma grande quantia de significados, mas que pairam sobre a mesma concepção: expressão de responsabilidade e preocupação que visa preservar, melhorar ou garantir a integridade e o bem-estar de alguém ou de algo.

Então, levando em conta esse sentido, já dá para entender um pouco melhor o trabalho de cuidado. Mas ainda assim, podemos traçar vários caminhos sobre sua definição.

Em geral, a primeira definição de trabalho de cuidado se dá como a atividades profissionais ou pessoais que envolvem assistência ou suporte a quem, por alguma razão, não pode cuidar de si mesmos. Sendo assim, essas atividades se mostram essenciais para manter a qualidade de vida e bem-estar de pessoas que precisam de ajuda devido à idade, doença, incapacidade ou outras condições.

Ainda mais, o trabalho de cuidado pode ou não ser remunerado – depende das condições seguidas por quem produz o trabalho.

O conceito de trabalho de cuidado

Essa definição para trabalho de cuidado acaba sendo a primeira a ser levada em consideração. Isso porque, ao pensar em trabalho, de forma automática já se pensa em ofícios profissionais. Então, como exemplos de trabalho de cuidado no Brasil, podemos pensar em:

  • Cuidados de Saúde: Como serviços médicos, de enfermagem, terapias e serviços de reabilitação.
  • Assistência Pessoal: Ajuda com atividades do dia a dia, como banho, vestuário, alimentação e mobilidade.
  • Apoio Emocional e Social: Oferecer companhia, escuta ativa e suporte emocional.
  • Educação e Desenvolvimento Infantil: Cuidar de crianças inclui educar, supervisionar e dar um ambiente seguro para que elas se desenvolvam.
  • Cuidados a Idosos: Suporte para atender o que a população mais velha precisa, muitas vezes combinando saúde, apoio pessoal e assistência social.
  • Apoio a Pessoas com Deficiência: Adaptação das atividades do dia a dia e oferta de suporte para ter inclusão e a autonomia.

Nesses casos, os trabalhadores de cuidado podem ser profissionais remunerados, como enfermeiros, assistentes sociais e cuidadores formados, Mas também, podem ser membros da família ou amigos que oferecem cuidados não remunerados.

Esse tipo de trabalho muitas vezes é vistos como uma expressão de solidariedade e de empatia. Além disso, é inegável que é um serviço muito importante para a sociedade. Isso porque contribui para a saúde, educação e bem-estar geral de todos.

Onde entra o papel da mulher no trabalho de cuidado no Brasil

Ao se tratar do “trabalho de cuidado” como o trabalho de suporte e assistência, a questão da mulher entra no fato de que esses serviços, na maioria das vezes, são dados como obrigação das mulheres. Segundo relatório de Janeiro de 2020 da Oxfam Brasil – uma ONG presente em 90 países que luta por um mundo mais justo e menos desigual – “Tempo de cuidar: o trabalho de cuidado não remunerado e mal pago e a crise global da desigualdade”, o valor monetário global que o trabalho de cuidado não remunerado feito por mulheres a partir dos 15 anos agrega à economia é de US$10,8 trilhões por ano.

Veja um trecho desse relatório:

“(…) mulheres e meninas, principalmente as que vivem em situação de pobreza e pertencem a grupos marginalizados, dedicam gratuitamente 12,5 bilhões de horas todos os dias ao trabalho de cuidado e outras incontáveis horas recebendo uma baixíssima remuneração por essa atividade. Seu trabalho é essencial para nossas comunidades. Ele sustenta famílias prósperas e uma força de trabalho saudável e produtiva. A Oxfam calculou que esse trabalho agrega pelo menos US$ 10,8 trilhões à economia.”

Ainda, a Oxfam também informa que as mulheres são responsáveis por mais de três quartos do cuidado não remunerado e fazem parte de dois terços da força de trabalho relacionadas a essas atividades de cuidado remuneradas. O infográfico exposto pela ONG ajuda a compreender melhor a informação.

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Trabalho de Cuidado no Brasil: veja o que é, exemplos e se é remunerado

Diante dos dados, podemos entender que a sociedade ainda se molda em uma estrutura em que o homem fica responsável pelo trabalho assalariado, enquanto a mulher – muitas vezes sem poder escolher – fica com os cuidados: seja aos outros, como a um parente enfermo, ou seja ao seu próprio lar.

A dinâmica dentro de casa

O trabalho de cuidado também pode se dar pelas atividades domésticas. Embora muitas vezes seja subestimado ou invisibilizado, o cuidado com a casa é uma forma essencial de trabalho de cuidado que engloba várias atividades diárias importantes para que o lar funcione bem, assim como a convivência entre os moradores.

Essas atividades domésticas podem incluir:

  • Limpeza e manutenção da casa
  • Lavagem de roupas
  • Preparação de refeições
  • Cuidado com as plantas
  • Organização dos espaços
  • Finanças da casa
  • Compras de supermercado

Nesse caso, aqui vemos mais um exemplo do trabalho de cuidado, em geral, não remunerado. Grande parte desse serviço é entregue às mulheres, seja por escolha própria, seja por outras motivações. Mas também, um fator muito necessário a se tratar são aquelas que vivem em jornadas duplas. Ou seja, além do trabalho de cuidado com a casa, também precisam trabalhar fora de casa (isso sem contar outras que também cuidam de terceiros, como filhos ou parentes).

A grande discussão sobre a invisibilidade desse tipo de trabalho é o fato de que grande parte das pessoas não enxerga como um trabalho, e sim como uma mera obrigação da mulher, muitas vezes imposta desde a infância.

Como dito pela Oxfam, “se ninguém investisse tempo, esforços e recursos nesse trabalho de cuidado, comunidades, locais de trabalho e economias inteiras ficariam estagnadas.”.

Sendo assim, cuidar é algo de extrema necessidade, e a valorização deste segue com a mesma necessidade. Muitas mulheres que assumem esse tipo de trabalho acabam não tendo tempo para cuidar de si e até de participar de atividades sociais e políticas. Um exemplo é um dado da Bolívia, onde 42% das mulheres afirmam que o trabalho de cuidado é o maior obstáculo para participação na política.

Precarização do trabalho de cuidado remunerado

A invisibilidade do trabalho de cuidado entra também na desvalorização e precarização salarial, bem como das condições desse trabalho. Um dos trabalhos considerados mais explorados é o de doméstica. Já ressaltamos novamente o fato do título ser focado nas mulheres: 80% dos que exercem essa profissão são mulheres. E, apesar do trabalho doméstico fazer parte da legislação trabalhista, contando com jornada de 44 horas semanais, controle de frequência, FGTS e outros direitos, muitos empregadores passam por cima disso.

Em âmbitos mundiais, há diversos dados que indicam que os trabalhadores domésticos não contam com a proteção da lei, salário mínimo e previdência social. No Brasil, o mesmo ocorre por baixo dos panos. Não é difícil encontrar na internet empregadores contratando diante de condições absurdas, e que muitas aceitam diante das suas necessidades. Veja, abaixo, alguns exemplos já encontrados.

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Trabalho de Cuidado no Brasil: veja o que é, exemplos e se é remunerado

Na imagem acima, podemos ver um anúncio feito no site OLX. Aqui, a pessoa procura especificamente uma mulher não só para serviços domésticos, como também para cuidar de alguém com necessidades especiais sem folga e sem registro para ganhar menos de um salário mínimo.

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Trabalho de Cuidado no Brasil: veja o que é, exemplos e se é remunerado

Acima, vemos outro exemplo de vaga, também postada na OLX e repostado na página do Facebook de mesmo nome da marca d’água. O contratante faz algumas exigências incabíveis perante a lei: mulher, estrangeira, faixa de idade específica, sem salário e que não apenas deve cuidar da casa, mas também deve ser babá e professora.

Não é difícil encontrar publicações com condições semelhantes, senão até piores. A página em questão, apesar do seu nome um tanto polêmico (“Vagas arrombadas”), sempre encontra e expõe pessoas que oferecem trabalhos que beiram ao absurdo.

Por que invisibilidade?

Então, vendo essas vagas e revendo o dado mundial de que só 10% das trabalhadoras domésticas são protegidas por leis trabalhistas gerais, nos traz a reflexão de como está sendo normalizada as condições precárias para um trabalho de tanta importância.

Muito vimos as pessoas perguntarem do “por que invisibilidade?”. Mas, é só pensar no nosso dia a dia como indivíduos que a pergunta já é respondida: ele só é visto quando está em falta.

Ninguém pensa na mulher que cozinha, que lava, que passa, que educa até que o almoço não esteja pronto, a roupa esteja amassada, a criança não esteja trocada. Seja remunerado ou não remunerado, de todo modo, está longe de ser valorizado.

E, além daqueles que pagam “por fora”, como nos exemplos anteriores, há aqueles que burlam as leis trabalhistas para pagarem salários menores do que deveriam. Ainda, as discriminações raciais também aparecem para decretar a desumanidade dessas trabalhadoras.

Helena Hirata, no ensaio “Trabalho de Cuidado: Comparando Brasil, França e Japão” aborda que “A grande maioria das cuidadoras entrevistadas eram negras ou pardas e evocaram situações de racismo, tanto em termos de violência verbal quanto de comportamentos racistas. A essas formas de racismo se acrescentam as situações de discriminação salarial por meio do não reconhecimento de suas qualificações. O número de enfermeiros(as) e de
auxiliares de enfermagem que são recrutados e remunerados como “cuidadores(as)” é muito significativo no Brasil. (…) Trata-se de uma prática de gestão para diminuir os custos salariais. (…) Sendo a formação para esse ofício muito precária no Brasil, os estabelecimentos preferem recrutar auxiliares ou técnicos de enfermagem com o segundo grau completo e mais um ou dois anos de formação para cuidar das pessoas idosas, oferecendo-lhes um salário de cuidador(a).

É preciso falar sobre

Por mais que seja um assunto de tantas questões, ainda assim, muitos o criticaram como tema no ENEM. Sendo assim, alegações que vão contra as estatísticas foram feitas nas redes. Isso mostra uma certa negação de parte da sociedade. Apesar de termos dados que mostram como as mulheres estão mais presentes e como seus direitos são ignorados, muitos ainda ressaltam que isso não é um problema social.

Por isso, é de muito valor que uma prova de grande porte como o ENEM trate desse assunto, pois ele traz discussões que antes, não estavam tão presentes entre os indivíduos. Então, de repente, torna-se uma pauta de relevância que leva muitos a refletir, a entender e tentar lutar por mudanças.

Enfim, todos nós sempre vamos ter muitas questões a evoluir sobre relações de empatia. E somente com discussões como essas que podemos ver um horizonte de novos direitos a serem conquistados.


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