Julius Baer rebaixa ações brasileiras após incertezas fiscais e corte de impostos

Julius Baer rebaixa ações brasileiras para neutras, citando incertezas fiscais e impacto de cortes e isenções

Arte: GDI
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O banco suíço Julius Baer reduziu sua recomendação para as ações brasileiras de “overweight” (exposição acima da média do mercado) para “neutra”, após uma série de desenvolvimentos fiscais no Brasil que afetaram a confiança do mercado. O rebaixamento, anunciado nesta sexta-feira (29), reflete a crescente incerteza em torno das políticas fiscais do governo brasileiro e o impacto de medidas como isenções fiscais e o prolongamento do aperto monetário.

O movimento de Julius Baer segue a tendência de outros grandes bancos internacionais, como o JPMorgan e o Morgan Stanley, que também ajustaram suas previsões para o Brasil nas últimas semanas. Segundo Nenad Dinic, estrategista de ações do banco, a decisão foi impulsionada pela falta de credibilidade fiscal do governo brasileiro, especialmente após o anúncio de um plano de corte de gastos que não conseguiu convencer os mercados da existência de uma consolidação fiscal significativa.

Cortes fiscais e impactos no mercado

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por meio do ministro da Fazenda Fernando Haddad, revelou na última semana um pacote de cortes fiscais com o objetivo de economizar R$ 71,9 bilhões até 2026. A proposta gerou reações mistas, mas foi ofuscada pela proposta paralela de isenção de impostos para trabalhadores com rendimento de até R$ 5 mil por mês, que afetaria aproximadamente 80% dos contribuintes.

A isenção, que visa beneficiar a parcela mais baixa da população, é estimada em R$ 35 bilhões anuais e foi apresentada como uma medida fiscal “neutra”, com a promessa de compensação através de impostos maiores sobre as faixas de renda mais altas. No entanto, o movimento não convenceu investidores, que temem que a medida aumente a pressão sobre as contas públicas, sem oferecer soluções concretas para a crise fiscal.

“A isenção de imposto de renda, embora de caráter social, foi vista como uma ação pontual, sem um plano robusto de reequilíbrio fiscal”, comentou Dinic. O analista destacou que, enquanto a intenção do governo é aumentar a arrecadação dos mais ricos, a medida pode resultar em um aumento considerável no déficit fiscal no curto prazo.

Reação do mercado: real em queda e taxas de juros em alta

A reação do mercado foi rápida e contundente. A moeda brasileira, o real, caiu de forma acentuada, atingindo um recorde histórico em relação ao dólar, com o câmbio chegando a R$ 6,00 no fechamento desta sexta-feira. A desvalorização do real está atrelada ao receio de investidores em relação à estabilidade fiscal do país e à possibilidade de novos aumentos nas taxas de juros.

As taxas de juros futuras também foram impactadas pela percepção de incerteza. O mercado passou a precificar uma alta adicional de 75 pontos base na taxa Selic, que poderia saltar dos atuais 11,25% para 14,50% até junho de 2025. Este cenário reflete a expectativa de que o Banco Central manterá a política de juros elevados por um período prolongado, dado o risco fiscal e a necessidade de controlar a inflação.

Desafios e perspectivas para o futuro

As incertezas fiscais permanecem no horizonte. Embora o governo tenha apresentado um pacote de medidas, o Congresso Nacional tem pouco tempo para deliberar sobre as propostas, com apenas três semanas restantes no ano legislativo. O processo legislativo pode diluir as medidas propostas ou atrasar sua implementação, o que aumenta a volatilidade.

O cenário de juros elevados e a falta de perspectivas de crescimento otimista para o Brasil também são fatores que pesam na análise de Julius Baer. O estrategista do banco, Nenad Dinic, observa que, embora o lucro por ação (LPA) das empresas brasileiras possa crescer 16% em 2025 e 15% em 2026, a revisão para baixo desses números é provável, dado o cenário de juros mais altos e a incerteza fiscal.

O analista alerta que, com o foco em 2025 voltado para o aperto monetário e a proximidade das eleições presidenciais de 2026, as questões fiscais devem continuar sendo um desafio importante para a economia brasileira. A possibilidade de um estímulo chinês ou uma desvalorização do dólar poderiam amenizar alguns dos efeitos negativos, mas não são suficientes para reverter a tendência de enfraquecimento da economia doméstica.

Rendimento fixo como alternativa mais atraente

Em meio à volatilidade, Julius Baer sugere que investidores interessados em exposição ao Brasil considerem as oportunidades em renda fixa. O banco acredita que, com taxas de juros reais elevadas, a renda fixa brasileira pode ser mais atraente do que as ações, pelo menos no curto e médio prazo.

Com um cenário fiscal e econômico cheio de incertezas, o Brasil segue sendo uma aposta arriscada para investidores estrangeiros, que aguardam um sinal mais claro de compromisso do governo com a consolidação fiscal antes de tomar decisões mais ousadas.