
- Moody’s aponta que medidas do governo não convencem investidores nem reduzem a pressão fiscal.
- Juros chegaram a 14,75% e podem subir mais diante da incerteza sobre controle de gastos.
- Expectativa é que nenhuma ação fiscal relevante ocorra antes de 2026.
O Brasil dificilmente verá uma melhora fiscal relevante antes das eleições de 2026, segundo análise da Moody’s Ratings. A declaração foi feita por Samar Maziad, vice-presidente da agência e responsável pela cobertura da América Latina. Em entrevista à Bloomberg News, ela apontou que os esforços do governo brasileiro para fortalecer a credibilidade das contas públicas ainda são insuficientes.
A Moody’s rebaixou em maio a perspectiva de crédito do país de positiva para estável, citando déficits elevados, lentidão nas reformas e aumento dos juros. Apesar de o Brasil ainda estar próximo do grau de investimento, a mudança acende um alerta sobre o futuro da política fiscal. A reversão da recomendação veio após um breve período de otimismo no mercado.
Para a analista, os aumentos na taxa Selic refletem diretamente as dúvidas dos investidores quanto à sustentabilidade fiscal. O Banco Central elevou os juros em 4,25 pontos percentuais desde setembro, chegando a 14,75% ao ano — o maior patamar em quase duas décadas.
Juros sobem em meio à desconfiança fiscal
Embora a alta dos juros fosse esperada, a intensidade surpreendeu os analistas. Segundo Maziad, o movimento evidencia que o mercado não está convencido de que o governo vá controlar os gastos públicos a tempo. O cenário fiscal deteriorado obriga o BC a manter a política monetária restritiva por mais tempo.
O Comitê de Política Monetária (Copom) se reúne na próxima semana e o mercado está dividido. Parte dos analistas acredita em manutenção da taxa, enquanto outros projetam um novo aumento de 0,25 ponto. Em qualquer caso, a falta de ancoragem das expectativas de inflação pressiona por uma postura mais dura.
Maziad destacou ainda que o atual arcabouço fiscal proposto pelo governo tem foco exagerado na arrecadação. Na visão da Moody’s, é necessário avançar também sobre a qualidade e o controle das despesas obrigatórias, que crescem de forma automática ano após ano.
Lula resiste a cortes e impasses aumentam
A proximidade das eleições complica ainda mais a situação. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pretende disputar um quarto mandato, tem resistido a iniciativas para cortar gastos ou revisar benefícios. Além disso, sua popularidade encontra-se em baixa, o que reduz o capital político para reformas.
Internamente, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, enfrenta obstáculos tanto dentro do governo quanto no Congresso para aprovar medidas de aumento de arrecadação. Planos como a elevação do IOF foram abandonados horas após sua divulgação, diante da reação negativa do mercado.
Com a rigidez orçamentária e sem uma base forte no Congresso, o governo tem poucas alternativas de curto prazo. A própria Moody’s ressalta que, para rever positivamente a nota brasileira, seria necessário um plano confiável, com apoio político e probabilidade real de implementação — algo distante do atual cenário.
Investidores perdem paciência e dólar sobe
A desconfiança dos investidores vem se manifestando nos mercados. Em dezembro, preocupações fiscais impulsionaram a venda de ativos brasileiros, e o real sofreu uma depreciação histórica frente ao dólar. Em maio, novo episódio obrigou o governo a recuar de propostas impopulares.
Conforme Maziad observou, o Brasil não está sozinho. Países como Reino Unido, Colômbia e Estados Unidos também enfrentam resistência crescente a déficits elevados. No entanto, no caso brasileiro, a ausência de uma resposta clara agrava a percepção de risco.
“A falta de sustentabilidade nas políticas leva a uma preocupação mais visível dos investidores. Trata-se, acima de tudo, de credibilidade”, afirmou Maziad. Para ela, será difícil ver avanços concretos enquanto o debate político estiver dominado pelas eleições e não pelas reformas estruturais.