Mercado pressionado

Carros elétricos em crise: faltam compradores na China

Fabricantes recorrem a táticas extremas para escoar estoques, enquanto governo chinês tenta conter colapso no setor.

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Crédito: Depositphotos
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  • Setor em crise; A guerra de preços liderada pela BYD expôs uma indústria com produção em excesso e baixa demanda, forçando táticas extremas.
  • Risco ao consumidor Descontos mascaram riscos graves de perda de qualidade, insegurança e instabilidade de preços.
  • Reação governamental; A China tenta conter os danos à sua imagem global, pressionando empresas por autorregulação e ética no mercado.

A indústria automobilística da China, antes vitrine global de inovação em carros elétricos, vive hoje uma tempestade perfeita. Sob liderança da BYD, a maior vendedora de elétricos do país, uma guerra de preços se intensifica, derrubando margens de lucro, forçando empresas à beira do colapso e provocando reações emergenciais do governo. O cenário já pressiona ações no mercado financeiro e expõe um setor com mais fábricas do que compradores.

Enquanto o governo de Xi Jinping convoca executivos para alertas formais e cobra autorregulação, consumidores hesitam em comprar, temendo quedas futuras nos preços. E para muitas montadoras, a única saída encontrada é vender veículos novos como usados. Uma crise que vai muito além dos preços baixos.

Capacidade ociosa e competição selvagem

O que inicialmente parecia ser uma boa notícia para o consumidor chinês — carros elétricos mais baratos — se revelou um alerta grave para a saúde do setor. A taxa média de utilização da capacidade instalada das montadoras foi de apenas 49,5% em 2024, de acordo com o instituto Gasgoo. Ou seja, mais da metade das linhas de produção está parada ou ociosa.

Esse desequilíbrio entre oferta e demanda acentuou a corrida por descontos. A BYD, que lidera as vendas domésticas, puxou a fila. Mas o movimento teve consequências drásticas. Apenas nas últimas semanas, a empresa perdeu US$ 21,5 bilhões em valor de mercado. As rivais, pressionadas, recorreram a cortes ainda mais agressivos. Analistas como John Murphy, do Bank of America, projetam uma “consolidação massiva” no setor, com fechamento de empresas menores e margens deterioradas mesmo entre os gigantes.

O Partido Comunista, por sua vez, tem feito apelos públicos para frear essa “competição desenfreada”, chegando a alertar sobre os riscos à imagem internacional dos produtos “Made in China”.

Efeitos colaterais atingem consumidores e marcas

Embora os preços baixos pareçam vantajosos, especialistas alertam para efeitos perversos. A volatilidade dos valores tem minado a confiança dos consumidores, que agora questionam se vale a pena comprar um veículo hoje. “Por que pagar agora se pode estar mais barato na semana que vem?”, reclamam usuários nas redes chinesas.

Além disso, as montadoras, ao tentarem sobreviver à maré de descontos, podem comprometer qualidade, segurança e assistência pós-venda. O jornal estatal Diário do Povo chegou a destacar que produtos de baixa qualidade lançados às pressas podem afetar seriamente a reputação do país nos mercados internacionais.

Há também táticas controversas sendo utilizadas: concessionárias têm vendido veículos com quilometragem zero como usados, prática que mascara os dados reais de vendas e permite “limpar” estoques sem reduzir o valor de tabela dos carros novos.

BYD sob holofotes e risco de monopólio

O comportamento agressivo da BYD levantou suspeitas até entre analistas estrangeiros. Para Jochen Siebert, da JSC Automotive, a empresa busca um domínio quase monopolista. “É evidente que o maior player está forçando o mercado até que os outros desistam”, afirmou.

Essa atitude preocupa não apenas os concorrentes locais, mas também os estrangeiros. Segundo Murphy, do Bank of America, montadoras norte-americanas deveriam até cogitar sair do mercado chinês. “Há muito risco envolvido, especialmente com esses níveis de cortes de preço.”

Enquanto isso, os executivos da indústria foram advertidos em Pequim para evitar práticas insustentáveis. Desse modo, foram orientados a não vender abaixo do custo nem aplicar descontos irracionais — embora essas práticas já estejam em pleno curso.

Luiz Fernando

Licenciado em Letras, apaixonado por esportes, música e cultura num geral.

Licenciado em Letras, apaixonado por esportes, música e cultura num geral.