Recursos judiciais

Um surto está acontecendo no mercado de trabalho e agora está nas mãos do STF

Alta de 75% nos recursos partiu de empregadores, que contestam sentenças trabalhistas na Corte.

stf hQIZGEy
stf hQIZGEy
  • Reclamações trabalhistas representaram 1/3 das ações no STF em 2024, com alta de 75% em relação a 2023.
  • Empregadores são os principais autores dos recursos, buscando reverter decisões da Justiça do Trabalho.
  • Gilmar Mendes lidera acolhimentos; Fachin e Dino se opõem à maioria das reclamações.

A atuação da Justiça do Trabalho passou a ser alvo recorrente de contestação no Supremo Tribunal Federal (STF). Nesse sentido, em 2024, um terço de todas as reclamações recebidas pela Corte teve como objetivo revisar decisões tomadas por tribunais trabalhistas. Sendo assim, o volume de recursos cresceu 75% em comparação com o ano anterior.

Pressão patronal ganha força no Supremo

De acordo com dados do Anuário da Justiça, elaborado pelo Conjur em parceria com o STF, 3.481 reclamações constitucionais relacionadas à Justiça do Trabalho foram apresentadas ao Supremo em 2024. Assim, esse número representa quase 35% do total de mais de 10 mil ações recebidas pela Corte naquele ano.

Além disso, essas reclamações partem, em sua maioria, de empregadores insatisfeitos com decisões judiciais que consideram desfavoráveis. Logo, o instrumento jurídico em questão é usado para garantir o cumprimento das decisões do STF e preservar sua competência constitucional, mas vem sendo usado como estratégia para reverter sentenças da Justiça especializada.

Em comparação com 2023, houve um salto expressivo. Foram 75% mais ações trabalhistas levadas ao Supremo, o que evidencia um movimento crescente de judicialização por parte do setor patronal. Portanto, para especialistas, esse fenômeno também reflete uma tentativa de reinterpretar a aplicação das normas constitucionais nas relações de trabalho.

Gilmar Mendes lidera votos favoráveis

Entre os ministros do STF, Gilmar Mendes foi o que mais acolheu reclamações trabalhistas nos últimos dois anos, considerando o total de 8.800 ações analisadas no período. Segundo o anuário, Mendes votou pela procedência total ou parcial em 77% dos casos que chegaram à Corte.

Ademais, outros ministros com elevado índice de acolhimento foram André Mendonça (74%), Luiz Fux (71%) e Cármen Lúcia (69%). Já Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Nunes Marques mantiveram um índice um pouco mais comedido, variando entre 66% e 59% de decisões favoráveis às reclamações.

Na outra ponta, os ministros Edson Fachin e Flávio Dino se destacaram por rejeitar a maioria dessas ações. Fachin considerou improcedentes 87% das reclamações trabalhistas, enquanto Dino rejeitou 64%. Desse modo, ambos defendem uma interpretação mais restritiva do papel do STF frente às decisões da Justiça do Trabalho.

Debate jurídico revela tensão institucional

Para especialistas, como o professor Ney Maranhão, da Academia Brasileira de Direito do Trabalho (ABDT), esse volume de ações não se limita a uma disputa entre partes. Ele representa também um embate entre visões institucionais sobre o alcance do STF frente à Justiça especializada.

Segundo Maranhão, é legítimo que o Supremo se manifeste quando há violação direta à Constituição. No entanto, ele ressalta que é preciso respeitar a autonomia interpretativa da Justiça do Trabalho, sobretudo nos casos em que as decisões se baseiam apenas na legislação infraconstitucional.

O aumento de reclamações também levanta questões sobre a segurança jurídica e a confiança nas instâncias inferiores. Maranhão alertou que o Supremo pode esvaziar a Justiça do Trabalho ao revisar todas as decisões trabalhistas. Entidades de juízes e advogados do setor já compartilham essa crítica.

Diálogo ou esvaziamento da Justiça do Trabalho?

O debate sobre os limites e as consequências das reclamações constitucionais cresce, mesmo com esse recurso previsto no ordenamento jurídico. O temor é de que o STF se torne, na prática, uma instância revisora de mérito trabalhista, o que contraria o desenho original do sistema judiciário brasileiro.

Ministros como Gilmar Mendes e Luiz Fux têm defendido que o Supremo tem papel fundamental para uniformizar o entendimento constitucional. Contudo, críticos alertam que isso pode abrir caminho para uma centralização excessiva de poder nas mãos da Corte Suprema, em detrimento da especialização jurídica.

Enquanto isso, empregadores continuam recorrendo ao STF como última alternativa para reverter sentenças, especialmente em um cenário de maior pressão econômica e aumento das condenações em temas como vínculo empregatício, dano moral e jornada de trabalho.

Luiz Fernando

Licenciado em Letras e Graduando em Jornalismo pela UFOP; Atua como redator realizando a cobertura sobre política, economia, empresas e investimentos.

Licenciado em Letras e Graduando em Jornalismo pela UFOP; Atua como redator realizando a cobertura sobre política, economia, empresas e investimentos.