
- Brasil liderou incêndios em 2024, respondendo por 42% da perda global de floresta primária tropical, ultrapassando o agronegócio como principal causa.
- Amazônia e Pantanal foram os biomas mais atingidos, com destaque para o impacto da pior seca já registrada no país.
- Especialistas alertam para risco de retrocessos ambientais, caso não haja mais investimento em prevenção, fiscalização e sustentabilidade no uso da terra.
O ano mais quente já registrado também revelou a face mais sombria da crise ambiental: os incêndios florestais atingiram níveis alarmantes e o Brasil foi o epicentro dessa devastação.
Segundo dados do Laboratório GLAD da Universidade de Maryland, reunidos pela plataforma Global Forest Watch (GFW), 2024 marcou uma virada histórica. Pela primeira vez, os incêndios superaram o agronegócio como principal vetor de destruição de florestas tropicais. E o Brasil, infelizmente, liderou o ranking: foi responsável por 42% de toda a perda de floresta primária tropical no planeta. A devastação equivale a uma área do tamanho do Panamá transformada em cinzas.
Seca extrema e fogo: a combinação devastadora
Ao contrário de anos anteriores, o desmatamento por expansão agrícola cedeu lugar ao fogo como protagonista da perda ambiental. A explicação está na pior seca já registrada no Brasil, intensificada por eventos climáticos extremos e agravada pelo El Niño.
Além disso, somente em território brasileiro, 66% da perda de cobertura nativa em 2024 foi causada por incêndios, um salto impressionante — e preocupante — em relação ao ano anterior. Em 2023, o fogo era responsável por apenas 10% das perdas. O crescimento ultrapassa seis vezes o índice anterior.
Portanto, as chamas atingiram particularmente a Amazônia e o Pantanal. Este último, inclusive, foi o bioma mais afetado no país. Nesse sentido, a Amazônia, por sua vez, registrou a maior perda de árvores desde 2016, sinal de alerta para a maior floresta tropical do mundo.
Cenário global fora de controle
O fenômeno não foi isolado. O estudo aponta que 2024 teve incêndios em larga escala tanto em florestas tropicais quanto boreais — uma situação inédita. Canadá e Rússia, por exemplo, enfrentaram temporadas de fogo intensas, contribuindo para um aumento global de 5% na perda de cobertura florestal.
A mudança do padrão climático, provocada pelo aquecimento global, fez com que o fogo se alastrasse em regiões que historicamente não registravam esse tipo de desastre. As florestas tropicais, porém, continuam sendo as mais vulneráveis, por sua baixa resiliência ao fogo e à interferência humana.
Apesar de serem ecossistemas úmidos, essas florestas estão cada vez mais expostas. Em boa parte dos casos, os focos de incêndio começam em áreas agrícolas próximas e se espalham de forma descontrolada, especialmente em períodos de seca prolongada e calor extremo.
Avanços pontuais, desafios persistentes
Segundo Mariana de Oliveira, diretora do programa de florestas do WRI Brasil, o governo Lula apresentou avanços em relação à gestão ambiental anterior, especialmente no combate ao desmatamento ilegal. No entanto, os incêndios florestais desafiam os limites da política pública ambiental.
“Ainda falta investimento sólido em prevenção, fiscalização contínua e políticas de uso sustentável da terra”, afirma Mariana. Sem isso, o risco é de retroceder em conquistas que custaram décadas de luta ambiental.
A perda de floresta tropical primária por outros motivos — além do fogo — também aumentou em 14% no ano, o maior crescimento desde 2016. Isso evidencia que os desafios vão além dos focos de incêndio: há uma pressão constante sobre a vegetação nativa vinda de diversas frentes, como a especulação fundiária e a mineração ilegal.