Troca de favores?

Fraude do INSS: Diretoria já sabia e mesmo assim não fez nada

Direção do instituto autorizou repasses à Contag mesmo após ordens para interromper as cobranças; Polícia Federal investiga omissão e possível conivência.

Crédito: Depositphotos
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  • A diretoria do INSS manteve descontos ilegais em aposentadorias mesmo após alertas e determinações contrárias de órgãos oficiais.
  • A Polícia Federal identificou indícios de omissão dolosa e possível favorecimento a entidades, que receberam cerca de R$ 6,3 bilhões de forma irregular.
  • O caso gerou pressões políticas, ações internas no governo e risco de novas investigações contra a cúpula do INSS.

Apesar dos sucessivos alertas de órgãos internos e externos, a diretoria do INSS manteve autorizações para descontos em aposentadorias destinados a diversas entidades, totalizando cerca de R$ 6,3 bilhões. Documentos revelam que a ordem para cessar os débitos partiu ainda em 2023, mas os valores continuaram sendo descontados até março de 2024. A Polícia Federal considera haver fortes indícios de omissão dolosa da cúpula do instituto, que pode responder por prevaricação e facilitação de esquema fraudulento.

Ignoraram alertas e mantiveram os descontos

Desde o início de 2023, a diretoria do INSS teve acesso a diversos alertas internos sobre a irregularidade dos descontos automáticos nos benefícios de aposentados. Contudo, mesmo após receberem recomendações explícitas para interromper a prática, os gestores mantiveram os repasses em favor de entidades associativas e sindicatos.

Segundo documentos obtidos pela Polícia Federal e revelados nesta terça-feira (29), os diretores ignoraram manifestações da Procuradoria Federal Especializada e da própria Controladoria-Geral da União (CGU). A investigação revela que as cobranças ocorriam mesmo em casos sem autorização expressa dos beneficiários.

Além disso, registros mostram que o então presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, assinou documentos que permitiram a continuidade dos descontos mesmo após a determinação contrária do Ministério da Previdência. A medida contrariou decisões superiores e pode ter facilitado o avanço do esquema.

Diante disso, a PF avalia que houve conivência da direção do instituto, uma vez que as evidências documentais e os pareceres internos não deixavam margem para dúvidas. Em outras palavras, a manutenção dos repasses ocorreu com pleno conhecimento de sua ilegalidade.

Cronologia da omissão: de 2023 a 2024

O relatório da PF detalha a cronologia dos acontecimentos. Em maio de 2023, o INSS foi notificado oficialmente sobre a necessidade de suspender os descontos relacionados às entidades. Contudo, os repasses continuaram por quase um ano, até março de 2024.

Durante esse período, mais de 344 mil aposentados foram afetados por cobranças indevidas. O valor total subtraído de suas aposentadorias ultrapassa R$ 6,3 bilhões, segundo estimativas atualizadas da CGU.

A investigação revela ainda que, em agosto de 2023, houve nova recomendação técnica contra os descontos. Mesmo assim, Stefanutto assinou a manutenção dos convênios com as entidades, autorizando formalmente as deduções. A Controladoria também advertiu o instituto sobre os riscos jurídicos, mas os avisos foram desconsiderados.

Além disso, há indícios de que os beneficiários não sabiam que estavam associados às entidades. Em muitos casos, sequer houve assinatura de autorização, o que reforça o caráter ilegal do esquema.

Omissão sob suspeita de crime

A Polícia Federal agora trata o caso como possível prevaricação e facilitação de desvio de verba pública. Os investigadores acreditam que a conduta da diretoria não foi apenas negligente, mas deliberada. Portanto, a conduta pode ter favorecido uma fraude estruturada.

O inquérito apura se houve troca de favores entre membros da diretoria do INSS e representantes das entidades beneficiadas. A hipótese de tráfico de influência também está sob análise. Até o momento, ninguém foi indiciado, mas diligências devem ocorrer nos próximos dias.

O Ministério da Previdência informou que colabora com a investigação e que uma força-tarefa interna revisará todos os convênios firmados pelo INSS. A Controladoria reforçou o alerta sobre a necessidade de mais transparência na gestão de entidades com acesso a consignados.

A gravidade do caso tem provocado reações no Congresso. Parlamentares da oposição pedem a abertura de uma CPI específica para investigar a atuação da cúpula do instituto. Já o governo tenta minimizar o impacto político, mas reconhece a necessidade de respostas públicas rápidas.

Luiz Fernando

Licenciado em Letras, apaixonado por esportes, música e cultura num geral.

Licenciado em Letras, apaixonado por esportes, música e cultura num geral.