- Associações e sindicatos descontavam mensalidades e empréstimos consignados sem autorização dos beneficiários, utilizando dados vazados.
- Flexibilização de exigências e falta de fiscalização permitiram a realização de descontos fraudulentos.
- Governo suspende descontos e considera ressarcimento às vítimas, com uso de recursos públicos como último recurso.
A crise das fraudes no INSS atinge um novo patamar com a revelação de que aposentados e pensionistas vêm sofrendo descontos indevidos por serviços não solicitados, vinculados de forma irregular a contratos de empréstimos consignados.
A prática de venda casada, escancara a fragilidade institucional diante de associações e empresas que operam à margem da legalidade. O impacto direto sobre a renda de milhões de brasileiros exige respostas urgentes. Até agora, o governo não apresentou soluções definitivas, embora tenha suspendido alguns convênios e prometido revisão nas parcerias.
Venda casada atinge milhões e gera perdas de bilhões
O rombo, causado por cobranças acopladas a empréstimos, pode chegar a R$ 219 bilhões, revelando o tamanho da brecha explorada por associações ligadas ao INSS. Conforme revelou a coluna da Folha, aposentados e pensionistas passaram a sofrer descontos mensais por serviços como assistência odontológica, jurídica ou seguros pessoais sem sequer terem autorizado. Essas cobranças ocorrem de forma automática, com base em convênios firmados com o INSS nos últimos anos — muitos deles ainda em vigor.
Esses valores, debitados diretamente dos benefícios, comprometem a renda de quem já vive com orçamento limitado. Frequentemente, os segurados nem percebem os descontos até sentirem falta de dinheiro para medicamentos ou alimentos. Além disso, as cobranças aparecem de forma pouco clara nos extratos, o que torna mais difícil o questionamento imediato. A digitalização dos serviços, apesar de prometer transparência, acabou facilitando fraudes silenciosas como essa.
Mesmo após denúncias recorrentes, os repasses continuaram sendo feitos até março, quando o governo anunciou a suspensão da averbação automática. No entanto, a medida chegou tarde para milhões que já foram prejudicados. A falta de fiscalização prévia demonstra o quanto o sistema previdenciário ainda permite que abusos prosperem, sobretudo entre entidades que deveriam proteger o beneficiário.
Prejuízo direto afeta aposentados mais vulneráveis
As vítimas mais atingidas por esses descontos indevidos são os aposentados de baixa renda, que enfrentam dificuldades para compreender e contestar os contratos. Muitos deles sequer têm acesso à internet ou não conseguem utilizar os canais digitais do INSS. Isso agrava ainda mais a desigualdade e coloca sobre os mais frágeis o peso de um sistema ineficiente.
Histórias de beneficiários que ficaram sem dinheiro para remédios ou comida tornaram-se frequentes nos últimos meses. Mesmo ao buscar ajuda, os aposentados encontram barreiras: centrais de atendimento sobrecarregadas, ausência de retorno e a complexidade dos termos usados nos contratos contribuem para um sentimento de abandono institucional. A cada semana, surgem novos relatos em sindicatos e defensorias públicas.
Associações e entidades envolvidas se registram como defensoras dos direitos dos segurados, mas atuam como repassadoras de produtos bancários disfarçados. Por meio de contratos pouco claros, elas incluíram cláusulas genéricas que permitiam o desconto automático de mensalidades. A prática foi sendo normalizada diante da omissão dos órgãos de controle.
Sistema falho reforça sensação de abandono
O cenário atual evidencia uma falha grave no controle de convênios do INSS, que permitiu a venda casada sem transparência ou consentimento claro. Mesmo com a digitalização de processos, não houve avanço correspondente em termos de fiscalização. A promessa de modernização acabou sendo usada como cortina para operações irregulares e lucrativas para empresas e associações.
Especialistas apontam que a revisão dos convênios em vigor é urgente, mas isso por si só não resolverá a crise de confiança. É preciso criar canais claros de denúncia e restituir, com prioridade, os valores retirados dos mais pobres. A ideia de que a Previdência Social deve proteger os vulneráveis não pode seguir sendo apenas discurso institucional.
O Ministério da Previdência promete criar regras mais rígidas, mas ainda não apresentou um cronograma concreto para isso. Enquanto isso, os aposentados seguem arcando com prejuízos de uma fraude que se estruturou justamente em cima da negligência do poder público. A ausência de responsabilização reforça a impunidade e mina a credibilidade do sistema.