
- Correios investiram R$ 34 milhões em eventos culturais, como a feira do livro de Bogotá e a Bienal de São Paulo.
- A estatal acumula déficit de R$ 2,6 bilhões, o maior da sua história, o que levanta críticas sobre as prioridades adotadas.
- A direção defende os patrocínios como forma de reposicionar a marca e cumprir sua missão social, apesar das controvérsias.
Os Correios investiram R$ 34 milhões em eventos culturais durante 2024, valor muito acima da média anual de R$ 430 mil registrada entre 2019 e 2022. A estatal patrocinou desde a Feira Internacional do Livro de Bogotá, na Colômbia, até o festival Lollapalooza. O aumento nos aportes, no entanto, ocorre em um cenário de forte instabilidade financeira, com déficit de R$ 2,6 bilhões acumulado até setembro do ano passado.
Visibilidade cultural como aposta estratégica
A 36ª Feira Internacional do Livro de Bogotá, realizada em abril, foi um dos principais eventos apoiados pelos Correios. O patrocínio de R$ 600 mil ajudou a viabilizar a presença brasileira na feira, que teve como tema “Leia a Natureza” e contou com a participação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sendo assim, ainda que a empresa não atue na Colômbia, a diretoria afirma que o apoio se justifica pela projeção internacional da marca. Assim, a ideia, segundo a estatal, é ampliar a visibilidade institucional e abrir caminhos para futuras cooperações com mercados da América Latina.
Já no cenário nacional, a Bienal do Livro de São Paulo recebeu R$ 400 mil. Os Correios promoveram oficinas, exposições e atividades interativas durante o evento. O objetivo declarado foi aproximar a empresa de públicos jovens e reforçar sua imagem como parceira da educação.
Além desses dois projetos, a estatal também investiu em outros eventos de grande repercussão. O festival Lollapalooza e a turnê “Tempo Rei”, de Gilberto Gil, receberam recursos. Segundo os Correios, essas ações permitem dialogar com diferentes perfis de público e reforçam a função social da empresa.
Déficit histórico levanta questionamentos
Embora o investimento cultural esteja dentro da estratégia de comunicação institucional, os números do balanço financeiro preocupam. Com um prejuízo acumulado de R$ 2,6 bilhões até setembro de 2024, os Correios vivem a maior crise de sua história.
Nesse sentido, o cenário é ainda mais delicado quando se observa que serviços básicos continuam com problemas. Reclamações sobre atrasos, falhas no rastreamento de encomendas e precariedade no atendimento seguem comuns em todo o país. Diante disso, muitas pessoas questionam a prioridade dada aos patrocínios culturais.
Parlamentares e especialistas em gestão pública alertam que, apesar do valor dos eventos culturais, a estatal deveria focar na modernização de sua estrutura. Investimentos em tecnologia, logística e recursos humanos poderiam, segundo eles, oferecer resultados mais diretos para a população.
A empresa, no entanto, argumenta que não se trata de uma escolha excludente. Para a direção, ações culturais e melhorias operacionais podem — e devem — caminhar juntas. A aposta é que a reconstrução da imagem pública também contribuirá para recuperar a confiança do consumidor.
Missão pública ou marketing institucional?
O debate sobre os patrocínios revela um impasse entre duas visões de Estado. De um lado, há quem defenda que empresas públicas precisam ir além dos lucros, apoiando a cultura, a educação e o acesso ao conhecimento. Os Correios, nesse sentido, estariam cumprindo um papel social legítimo.
Do outro lado, estão os que argumentam que, em tempos de crise, o foco deve estar nos serviços essenciais. Para esse grupo, a população espera eficiência, rapidez nas entregas e um atendimento digno. Patrocínios, ainda que bem-intencionados, seriam um luxo fora de hora.
Além disso, podemos ponderar que investir em imagem não é, por si só, um erro. No entanto, a reputação de uma marca pública se sustenta na prática, e não apenas em ações promocionais. Se o serviço não acompanha a propaganda, o resultado pode ser inverso ao desejado.
No meio desse embate, a estatal segue tentando equilibrar as demandas operacionais com o desejo de se reposicionar. Desse modo, resta saber se o público vai aceitar essa estratégia ou cobrar uma postura mais pragmática.