
- Professor aponta que desvalorização do real encarece insumos, pressiona custos e afeta setores como o agronegócio.
- Moeda fraca melhora exportações, mas compromete produção interna e revela fragilidade da economia nacional.
- Especialista defende reindustrialização e estratégia de longo prazo para tornar o real mais resistente a choques externos.
A recente desvalorização do real frente ao dólar, impulsionada por tensões no Oriente Médio, reacendeu o debate sobre a vulnerabilidade do Brasil a choques externos. Especialistas apontam que é preciso mais do que ações emergenciais: o país deve adotar uma política econômica estratégica e de longo prazo para blindar sua moeda.
Real fraco e choque global: uma combinação perigosa
A valorização do dólar em momentos de instabilidade global tem provocado a saída de capital dos países emergentes. Com isso, o real perde força, pressionando custos internos e prejudicando setores estratégicos da economia brasileira. A avaliação é do professor de Negócios Internacionais da PUC-PR, João Nyegrey, em entrevista à BM&C News.
Segundo ele, o real sofre sempre que o cenário externo entra em crise. Essa oscilação cambial eleva o preço dos insumos importados e prejudica o planejamento de segmentos como o agronegócio, que depende fortemente de fertilizantes e maquinários vindos do exterior.
Além disso, a desvalorização da moeda nacional reforça a percepção de instabilidade econômica. “A cada crise global, o real desaba. Isso é sinal de que nossa economia não tem resiliência suficiente”, afirma Nyegrey. Para ele, a dependência de exportações de commodities acentua a fragilidade cambial do país.
Agronegócio ganha e perde com a mesma moeda
Um dos setores mais impactados pelo câmbio é o agronegócio. Por um lado, o real desvalorizado torna os produtos brasileiros mais competitivos no mercado internacional. Por outro, aumenta o custo de produção, pois a maior parte dos insumos agrícolas é comprada em dólar.
Nyegrey destaca essa contradição. “O agro se beneficia nas exportações, mas paga caro para produzir. Essa lógica desequilibra a cadeia produtiva e exige planejamento sofisticado, como contratos de hedge e gestão de riscos cambiais”, explica.
Além disso, a alta no custo dos insumos pode reduzir margens de lucro e forçar pequenos produtores a adiar investimentos. Com menos previsibilidade, a competitividade do setor tende a ficar ameaçada a médio prazo, segundo o especialista.
Esse cenário torna ainda mais urgente o debate sobre políticas públicas voltadas à segurança cambial. Embora algumas grandes empresas do setor já adotem proteção contra flutuações, boa parte do agronegócio nacional continua vulnerável à volatilidade.
Soluções dependem de visão estratégica e institucional
Para proteger a moeda nacional, Nyegrey defende a adoção de uma estratégia de longo prazo, que vá além de respostas pontuais. Ele acredita que o fortalecimento do real exige ações estruturais e vontade política para transformar a base da economia brasileira.
“Não podemos continuar presos a um modelo exportador de baixo valor agregado. É preciso investir em reindustrialização, inovação e política comercial ativa”, ressalta. Na visão do professor, uma moeda forte é reflexo direto de uma economia sólida, diversificada e preparada para competir globalmente.
Outro ponto crítico, segundo ele, é a falta de preparo institucional. “O Executivo e o Legislativo deveriam estar liderando um plano de resposta a choques cambiais, mas não vemos esse protagonismo.” Para Nyegrey, a ausência de uma política econômica articulada compromete a confiança na moeda.
O professor conclui que, enquanto o país seguir vulnerável às crises externas, o real continuará sendo um reflexo de suas fragilidades internas. “O Brasil precisa decidir se quer seguir reagindo às crises ou começar a preveni-las com inteligência e estratégia.”